DECLARAÇÃO POLÍTICA DO PRESIDENTE DO CONSELHO DE ESTADO DA REPÚBLICA DE CUBA
A minha recusa de apresentar as provas do que aconteceu em Monterrei, o que me obrigou a ir embora no mesmo dia do meu discurso na Cimeira, devia-se a que o senhor Castañeda tinha arrastado na sua descocada aventura ao Presidente Vicente Fox. Não podia apresentá-las sem implicar ao próprio Chefe de Estado mexicano.
A atual conspiração contra Cuba em Genebra foi urdida pelo senhor Castañeda em Washington. O governo tcheco já estava aborrecido do seu custoso e desacreditante papel mercenário. O governo dos Estados Unidos no ano passado, depois da resolução imposta pela força contra Cuba em Genebra, perdeu a sua condição de membro da Comissão de Direitos Humanos em humilhante e merecido castigo mediante voto secreto do Conselho Econômico Social (ECOSOC). Foi a mais vergonhosa derrota sofrida desde que foi criado esse órgão em 1945.
O chanceler mexicano Jorge Castañeda se oferece para latino-americanizar a nova e astuta manobra. Uma proposta cínica, arranjada, enganosa devia ser promovida por delegações latino-americanas na Comissão de Direitos Humanos. A isso dedicou-se o resto do ano 2001, originando reiterados incidentes com Cuba, os que foram criticados por personalidades políticas e membros da Câmara dos Deputados e do Senado do México.
Já desde o 20 de Abril de 2001, um dia depois da votação da resolução contra Cuba, na qual o México se absteve, o companheiro Felipe Pérez Roque, Ministro dos Negócios Etrangeiros do nosso país, declarou que o chanceler do México Jorge Castañeda, tinha feito todo o possível para tratar de que o México mudasse a sua posição e Cuba fosse condenada. Ao longo de todo esse ano, o senhor Castañeda dedicou-se a fazer intrigas e conspirar nessa direção.
Nos começos deste ano, por inciativa do México se concretiza a viagem a Cuba duma delegação de alto nível, presidida por Fox, com o pretexto de melhorar as relações entre os nossos dois países. A Conferência de Monterrei estava próxima. Bush, igual do que Reagan em 1981, aquando uma Cimeira de Chefes de Estado e de Governo Norte-Sul que efetuar-se-ia no México no mês de Outubro desse mesmo ano, ameaça com não assistir se Cuba participava. A honra, e os deveres do governo do México de novo entravam em contradição com seus interesses. Entenda-se bem, do governo do México, nâo falo do irmâo povo do México. A viagem a Cuba de Fox e Castañeda aonde chegaram a 3 de Fevereiro às 10:30 hrs esteve minuciosamente desenhada. Em todo havia doblez e cálculo. Conhecíamos perfeitamente que um dos objetivos era nos solicitar que renunciássemos a nossa participação. Não se atreveram. Bastou a primeira hora de reunião iniciada às 11:45 hrs. Os primeiros minutos foram quase suficientes. Adiantei-me a lhes recordar o convite enviado pelas Nações Unidas para participar nessa Cimeira. Depois analisei profundamente toda a hipocrisia e perfídia das manobras contra Cuba em Genebra.
O intercâmbio de opiniões com Fox e outros membros da delegação essa manhã tornou-se sério e produtivo sobre vários temas. Castañeda mexia-se nervoso e inquieto —não pensem que tenho algo em contra dele.
Houve um almoço ligeiro com Fox e sua delegação, ao acabar a primeira reunião. Uma coroa de flores colocada ante o monumento a Martí. Um amplo percurso programado em que o acompanhei todo o tempo. Conversamos durante os trajetos com bastante seriedade e familiaridade sobre vários temas. Visitamos Havana Velha; um centro gerador de eletricidade ao leste da capital que funciona com gás de petróleo mediante uma tecnologia de ciclo combinado. A sugestão minha, tivemos um encontro na casa de Eusebio Leal, Historiador da Cidade, a quem Fox acabava de condecorar, para visitar a mãe dele que estava convalescente.
Finalmente o percurso acabou no Centro Internacional de Restaração Naurológica onde numeros mexicanos recebem exitosos tratamentos.
Por outro lado, às 16:00 hrs dessa tarde o nosso Ministro dos Negócios Estrangeiros estava reunido com o senhor Catañeda. Este não se atreveu sequer a discutir com Felipe a história do projeto contra Cuba em Genebra. Não mencionou a Cimeira de Monterrei, e lhe promete que o México não patrocinará nem apoiará nenhuma moção contra Cuba em Genebra. Às 20:00 hrs, recepção oficial no Palácio da Revolução, 20;53 reunião privada com o Presidente Fox no meu gabinete. Quando abordamos o tema de Genebra, depois de várias disquisições, garantiu-me que textualmente o México nunca faria alguma coisa que afetasse a Cuba, visto que eram muitos anos de relacões que não queriam que se afetassem de maneira nenhuma. Mais tarde, o jantar privado num ambiente amistoso. A visita nos deixa uma impressão positiva. Foram muitas horas de intercâmbio respeituoso e aparentemente sincero.
Poco tempo durou, no entanto, a agradável impressão. Castañeda começou fazer declarações enigmáticas e extranhas: "Deixaram de existir as relações do México com a Revolução Cubana e começaram com a República de Cuba...", "a posição mexicana de hoje não é a posição do passado", etc. Pouco depois viajou a Miami para inaugurar a 26 de Fevereiro um instituto cultural do México. Ali está convidada uma curiosa fauna de terroristas de origem cubana e contra-revolucionários que jamais nada tem tido a ver com a cultura. Aborda de novo as lucubrações teóricas sobre as relações do México com a Revolução o com a República e lhes profere aos seus selectos ouvintes adoçadas palavras. Declara: "As portas da Embaixada do México em Havana estão abertas para todos os cidadãos cubanos, da mesma maneira que o está o México. Redatores da subversiva e mal chamada Radio Martí manipulam as suas palavras, e durante todo o dia seguinte repetem que se romperam as relações entre o México e Cuba e as portas da Embaixada desse país em Havana estão abertas para todos.
Acontece um grave incidente, nesse mesmo dia pela noite, resolvido só pela cooperação séria e eficaz de Cuba, na madrugada de 1 de março, solicitada pelo governo mexicano sem o menor prejuízo para os assaltantes da sede. Espalham-se mentiras e grossas calúnias. Até se afirma que todo foi devido a uma provocação de Cuba. Começava Março. A Cimeira de Monterrei estava muito próxima.
Como costuma a acontecer, nunca anuncio a decisão de assistir ou não a tais eventos. São obvias as razões. E quando o decido, só a última hora o comunico a quem corresponda. Há quem chegam a esses eventos inclusive sem tê-lo informado previamente, e jamais tem tido dificuldades com os anfitriões. Nesta ocasião tomada a decisão aproximadamente três días antes, anunciei a minha chegada com 24 horas de antecedência, em 19 de Março. Tinha duas razões: Nem Bush queria a minha presença nem o próprio Fox. Também não desejava me envolver numa longa discusão com Fox e Castañeda tratando de persuadir-me e implorándo-me que não fosse. Já tinha acontecido assim na data prevista quando o Presidente Reagan ameaçou com boicotar a reunião em 1981 e me vi na obrigação de comprazer ao Presidente José López Portillo. Mas este, no meio da sua vergonha e a sua pena comportou-se como um cavalheiro. Foi elegante, me convidou a Cozumel, e com toda franqueza me explicou a sua tragédia. Acedi.
Mas esta vez mudaram os homens e os tempos. A situação internacional hoje é extremamente grave e complexa. Abordáva-se nessa Conferência um tema de vital importância para todos os países do mundo pobre e explorado. Era o meu direito assistir e decidi assistir. Sabia que logo que comunicasse a noticia da minhha participação o Presidente dos Estados Unidos não demoraria um minuto em conhecê-lo, com as inevitáveis pressões sobre o México. Não desejava lhes dar muito tempo para isso. Redigi uma breve carta e dei instruções ao nosso Embaixador de entregá-la na Presidência do México às 19:00 hrs de Cuba, 18:00 hrs hora do México.
Embora Monterrei estava cheia de delegados, a nossa delegação tinha alugado com tempo 20 dos 40 quartos de um pequeno hotel recém inaugurado. Devido à incerteza sobre a viagem, todas não foram alugadas. Também desejávamos desinformar aos eternos e onipresentes terroristas treinados, mimados e protegidos pelos Estados Unidos. A última hora bastava com a mitade daquele hotelinho.
O conteúdo da minha carta, já publicada pelo senhor Castañeda para manipular uma frase que lhe serviria para elaborar um argumento com o que tentaria explicar meu rápido regresso, dizia textualmente:
"Havana, 19 de Março de 2002
"Estimado Presidente:
"Li novamente com atenção a sua amável carta de 28 de janeiro do presente ano, na qual me convida a participar na Conferência Internacional sobre Financiamiento para o Desenvolvimento, das Nações Unidas que se celebrará em Monterrei. Já antes, a 21 de Dezembro de 2001, tinha recebido o convite dos embaixadores Shamshad Ahmad e Ruth Jacoby, co-presidentes do Comitê Preparatório das Nações Unidas.
"A enorme quantidade de trabalho que tive nas últimas semanas não me permitia ter a certeza de poder participar na referida Conferência, o que realmente me faz sentir muita pena com o México, sede desse importante evento e com as Nações Unidas, que tanto interesse tem dedicado ao mesmo.
"É por isso que tomei a decisão de realizar um esforço extra e participar nessa reunião, embora fosse pelo mínimo de tempo possível, o que tenho a satisfação de comunicar-lhe, em primeiro lugar, ao senhor.
"Espero poder contribuir com espirito construtivo ao sucesso desta Conferência à que o México tem dedicado grandes esforços.
"Ao desejar-lhe sucessos, estimado Presidente Fox, lhe reitero votos de amizade e consideração pessoal.
"Fidel Castro Ruz."
Anunciar que me estadia seria breve, significava às claras que me limitaria só aos dois días de Conferência —essa era realmente a minha intenção— e não incluiria nenhum outro programa adicional no México.
Ao nosso Embaixador, quando entregou a carta, ao Secretàrio pessoal do Presidente, informaram-lhe que Fox sairia quase de imediato para Monterrei. Cumprida essa tarefa, o nosso representante foi aos escritórios do Secretário de Governação, a quem comunicou a noticia para realizar as coordenações pertinentes. Nossa chegada a Monterrei produzir-se-ia 24 horas depois.
Ao redor das 23:00 hrs, hora de Cuba, se recebe no meu gabinete uma chamada do México comunicando que o presidente Fox queria falar comigo o mais urgente possível. Como não estava no meu gabinete se lhes pede repetir a chamada um pouco mais tarde. Às 23 hrs e 28 min. entra outra chamada do México. Nesse momento estava reunido com vários companheiros numa pequena sala não longe do meu gabinete. Fiquei estranhado com a chamada a essa hora. Que estranho, o Presidente vai cedo para a cama! O tom era de urgência. Já não tive dúvidas. Fui para o meu gabinete e pedi que me comunicassem com o Presidente Fox. Então se produz um insólito diálogo, que transcrevo tal como ficou registado.
Fidel.- Diga, senhor Presidente, como vai?
Fox.- Fidel, como está?
Fidel.- Muito bem, muito bem, obrigado, e os senhor como está?
Fox.- Que gosto! Olha, Fidel, te chamo por esta surpressa que tive há duas horas quando soube da tua pretendida visita ao México. Primeiro, antes de mais, gostaria de dizer que esta conversa seja privada entre tu e eu, estás de acuerdo?
Fidel.- Sim, de acordo. O Sr. recebeu a minha carta, não e? Sa enviei...
Fox.- Sim, recebi a tua carta há um par de horas e por isso é que te chamo agora.
Fidel.- Ah, muito bem, tinham-me dito que o Sr se deitava cedo e enviamos a carta cedo para lá.
Fox.- Sim, me deito cedo, mais isto me manteve acordado.
Fidel.- Não digas!
Fox.- Não, é que me chegou... Aqui são 10:00 horas da noite, me chegou às 8:00 horas, e estávamos aqui precisamente jantando com Kofi Annan.
Fidel.- Ah!
Fox.- Mas, olha, Fidel, eu te falo primeiro como amigo.
Fidel.- Sim, me fala primeiro como amigo, espero que não me diga que não va.
Fox.- (Ri) Bom, vamos ver, deixame falar, para saber o que é que opinas.
Fidel.- Eu o escuto, mas o advierto de antemão. Muito bem.
Fox.- Diga...?
Fidel.- Eu o escuto, mas o digo de antemão.
Fox.- Escútame primeiro. Escútame primeiro.
Fidel.- Sim.
Fox.- Sim, como amigo, a verdade é que assim de última hora e esta surpresa sim me crias uma boa quantidade de problemas.
Fidel.- Por quê?
Fox.- Problemas se segurança, problemas de atenção.
Fidel.- Bom, não me importa, eu não tenho nenhuma preocupação, senhor Presidente; parece que o senhor não me conhece.
Fox.- Tu não tens preocupações por isso.
Fidel.- Não, o garanto que nenhuma; não levo 800 homens como leva o senhor Bush.
Fox.- Mas não é muito de amigos avisar a última hora que aparecerás aqui.
Fidel.- Sim, mas eu corro muitos riscos que ninquém corre, o senhor sabe disso perfeitamente bem.
Fox.- Bom, mas tu podes confiar num amigo e me podias ter informado um pouco antes que pretendias vir, isso eu acho que teria sido muito melhor para ambos os dois.
Mas, olha, de fato eu sei que não só tens o direito, senão, se não podes me ajudar como amigo nesse sentido e para ti é indispensável...
Fidel.- Sim, diga-me em quê posso ajudá-lo menos nisso.
Fox.- Bom. Em quê podes me ajudar menos nisso?
Fidel.- Diga-me como? O que devo fazer? Eu corro os riscos tranqüilamente. (Já a coisa ia ficando mais séria: nem o vizinho do norte nem o país sede tinham muitos desejos que eu fosse)
Fox.- Deixa ver...
Fidel.- Mas o senhor compreenderá que provocaria um escândalo mundial se agora me dizem que não va.
Fox.- Mas que necessidade tens de formar um escândalo mundial, se te estou falando como amigo.
Fidel.- Oiça, é que o senhor é o Presidente do país, e se o senhor é o anfitrião e mo proíbe não teria mais remédio que até publicar o discurso amanhã mesmo.
Fox.- É assim, é assim. Tu tens todo o direito. Vou-te fazer uma proposta.
Fidel.- Sim.
Fox.- Sim?
Fidel.- Me diga.
Fox.- Não sei quando é que pretendes vir, porque isso não mo dizes, mais a minha proposta é que venhas na quinta-feira.
Fidel.- Diga-me exatamente, estou disposto a escutar uma transação nisto. Bem, que dia é hoje? Terça-feira. A que horas o senhor quer que o chegue na quinta-feira.
Fox.- Porque tu tens... ou seja, Cuba tem reservada a sua apresentação ante o pleno para a quinta-feira.
Fidel.- Sim, sim a hora exata ai, ai estavam... a quinta-feira deve ser.
Fox.- Ao redor da 1:00 hora da tarde.
Fidel.- Não, na quinta-feira tenho de participar numa mesa redonda e tenho que fazer o discurso pela manhã.
Fox.- Porque tu tens discurso pela manhã por volta das 13:00 horas da tarde.
Fidel.- Mais ou menos. Eu ajudo em tudo, não lhe molesto em nada, nem vou aos jantares, nem sequer a reunião... Bom, essa reunião já a teriamos que discutir.
Fox.- Está bem, está bem, deixa-me terminar.
Fidel.- Sim.
Fox.- Que podes vir na quinta-feira e que participes na sessão e faças a tua apresentação, visto que está reservado o espaço de Cuba para as 13:00 hrs. Depois temos um almoço que oferece o governador do Estado aos Chefes de Estado; inclusive te ofereço e te invito a que estejas nesse almoço, inclusive que te sentes ao meu lado e que terminado esse evento e o discurso vais embora, e assim...
Fidel.- À ilha de Cuba.
Fox.- Não, bom, ao melhor buscas...
Fidel.- Aonde? Ou ao Hotel? Diga-me.
Fox.- À ilha de Cuba ou aonde quiseres ir.
Fidel.- Correto.
Fox.- E que me deixaras livre —e é a petição que te faço— na sexta-feira para que não ma compliques.
Fidel.- O senhor não quer que eu lhe complique a sexta. Muito bem parece que o senhor não leu uma linha em que lhe digo que vou com espirito construtivo, a cooperar com o sucesso da Conferência.
Fox.- Sim, sim li essas linhas.
Fidel.- Se a minha palavra não lhe causou efeito... Eu compreendo o resto das coisas, das quais não vamos falar, e o que pode acontecer. Quase adivinhei que o senhor me chamaria para me dizer uma coisa parecida a essa. Porém, muito bem, com toda franqueza o digo: Estou disposto a cooperar com o senhor e a fazer o que está solicitando.
Fox.- Podemos fazê-lo desta maneira.
Fidel.- Sim, mo repite, por favor.
Fox.- Chegar na quinta-feira de manhã, à hora que quiseres.
Fidel.- Sim, quinta de manhã, pronunciar o discurso.
Fox.- Sim, pronunciar o discurso no pleno; participar no jantar de Chefes de Estado e onde eu te convido, inclusive, a estar sentado ao meu lado.
Fidel.- Muito bem, muito obrigado.
Fox.- E na tarde, sair a hora que te convenha.
Fidel.- Sim, muito bem. Vou ver o horário, ali há uma hora de diferença, a hora em que me tenho que mover.
Fox.- Temos uma hora de diferença.
Fidel.- Se por acaso tivesse que chegar um pouquinho mais cedo, digamos porque já sei onde é que provoco o maior prejuízo (Ri), mas talves pudesse estar ali ao amanhecer.
Fox.- Da quinta-feira?
Fidel.- Porque a hora é a 1:00 e ali estavam negociando a hora do turno, talvez eu fale antes; talvez, porém estou preparado para essa hora mais ou menos visto que há 30 oradores. Eu fui prejudicado porque foi a última hora, e o confeso, que tomei a decisão a última hora. O senhor me censurava deve dizê-lo ou não.
No primeiro lugar tenho duas coisas: tenho os riscos e, além disso, não tinha tomado a decisão. Essa é a verdade.
Fox.- Sim, sim, compreendo.
Fidel.- Mas decidí, num momento dado, que era conveniente como o expliquei na minha carta. Peço-lhe que quando puder a leia novamente.
Fox.- Aquí a tenho frente a mim.
Fidel.- E o Secretário Geral está próximo do senhor, não está jantando com ele?
Fox.- Acaba de ir há 15 minutos. Foi ao hotel e amanhã vai para Monterrei.
Fidel.- Que pena que não possa escutá-lo quando fale, porque acho que fala no começo.
Fox.- Fidel, tu... tu... sim eu sei que...
Fidel.- Bom, se o senhor me coseguisse que eu usasse o turno 10
Fox.- Deixa ver, espera ai.
Fidel.- Sim.
Fox.- Eu tenho una participação na quinta-feira, arranca a cerimônia de inauguração às 09:00 horas.
Fidel.- Às 09:00 h oras, muito bem.
Fox.- Suponho que a essa hora vai falar o Secretário Geral e vou falar eu.
Fidel.- Sim, eu gostaria escutá-lo a ele, porque foi ele quem me convidou.
Fox.- Não há problemas que venhas a isso.
Fidel.- O senhor é o presidente do país anfitrião não era Estados Unidos, era o México.
Fox.- Não há problemas em que venhas a isso, que chegues cedo e que participes dessa inauguração; desde as 09:00 hrs que começamos, falará ele e falarei eu, e efetivamente tu lugar é como o número 10.
Fidel.- Não, o meu lugar é o número 30; mas se o senhor me arranja o 10, quer dizer, depois que falem os principais —acho que começa Chávez como Presidente do grupo dos 77— se o senhor me consegue o turno 10 ou 12...
Fox.- Mas queres que te mude de aí, digamos un pouco antes das 13:00 hrs?
Fidel.- Fale com Kofi e coloque a ele o seu problema, ele vai entender que o mundo tem donos e que isso é muito sério.
Fox.- Posso falar com Kofi Annan (Ri).
Fidel.- Fale com Kofi (Risos) compreende?
Fox.- Sim, sim, posso falar com ele.
Fidel.- Então eu comprazo muito mais o senhor, apareço ali e falo. Quase seria melhor chegar a meia noite dormir um pouco e depois ir para lá.
Fox.- Avisa-me a que horas vais... se chegas muito cedo eu tenho uma residência, um lugar aonde chegar.
Fidel.- Bom, eu tinha um hotelinho, alguns quartos porque não estava decidido se ia.
Fox.- Sim, é que não há cuartos, esse é o problema.
Fidel.- Não, mas a nossa delegação tem 20 quartos ali e alguns deles os podemos mandar para outros pontos, uma casa de hóspedes.
Fox.- Sim, inclusive nos acomodamos, tu tens amigos em Monterrei que em uma hora te podem instalar isso não é problema. Tu tens que chegar de madrugada...
Fidel.- Eu posso comprazê-lo melhor. Tenho que chegar de madrugada?
Fox.- Sim, a que chamas madrugada, 5:00h ou 6:00h da manhã.
Fidel.- Não eu preferiria ao redor das 22:00 hrs, uma hora determinada.
Fox.- Ah! Chegar na noite da quarta-feira
Fidel.- Sim, sem que ninguém me veja. Nos vemos de manhã ali, que me vejam de manhã.
Fox.- Que seja mais para a noite e veremos como nos acomodamos, quer dizer mais para a meia noite ou a madrugada.
Fidel.- Bem.
Fox.- Chegas, te hospedas e participas desde as 09:00 hrs.
Fidel.- Me hospedo e estou ali às 08h30 min.
Fox.- De acordo.
Fidel.- Então o senhor me garante com o Kofi Annan e lhe explica os problemas; senão teria que falar e explicar-lhe porquê é que me convidam as Nações Unidas.
Fox.- Não há problemas.
Fidel.- O senhor como anfitrião foi muito amável ao me enviar o convite, mas são as Nações Unidas as que me convidam. E foi o primeiro que disse logo que começamos as conversações aqui.
Fox.- Bem, por isso.
Então, vamos continuar pensando assim, dessa maneira. Depois terminamos...
Fidel.- Correto. Então eu o comprazo e vou embora mais cedo. Eu tenho desejos de estar aquí, tenho muito trabalho e muitas coisas com as que estou entusiasmado.
Fox.- Fidel, te posso pedir outro favor?
Fidel.- Diga.
Fox.- Que estando em casa servir-me-ia bastante que não houvesse declarações sobre o tema da Embaixada ou das Relações México-Cuba ou desse evento que vivimos nestes dias passados.
Fidel.- Não tenho necessidade de fazer ali declarações.
Fox.- Que bom!
Fidel.- Diga-me em que outra coisa posso serví-lo.
Fox.- Básicamente não agredir aos Estados Unidos ou ao presidente Bush, senão nos limitar...
Fidel.- Oiça, senhor Presidente, eu sou um individuo que levo 43 anos em política e sei o que faço e o que devo fazer, não tenha dúvida nenhuma que eu sei dizer a verdade com decência e com a elegância necessária. Não tenha o menor temor que ali não vou soltar nenhuma bomba. Embora a verdade é que não estou de acordo com o consenso proposto ali. Não, eu vou expôr minhas idéas básicas e fundamentais e o farei com todo o respeito do mundo. Não vou tomar aquilo como tribuna para agitar: vou dizer a minha verdade. E posso não ir e dizê-la desde aquí, a digo amanhã de manhã, assim que para mim não é...
Fox.- E que tu na tua carta me ofereces precisamente isso: participação construtiva para que seja um verdadeiro contributo à discussão, ao debate e a solução dos problemas que todos temos no mundo.
Fidel.- Sim, senhor Presidente, o senhor deve ter em conta que quando faço estas viagens as façco com bastante risco.
Fox.- Sim, isso o compreendo.
Fidel.- Deve sabê-lo quando tomo a decisão de ir. Não tenho ido a muitos lugares, não fui a Cimeira lá no Perú, mas tenho um conceito mais elevado da importância desta conferência e um conceito mais elevado do México, inclusive, parecia-me que o estaria magoando, em realidade ao senhor ou aos mexicanos.
E não vou ali nem a agitar nem a organizar manifestações. Tenho presente que o senhor é o Presidente desse país e que um desejo seu, por muito que sejam os direitos, devo tomá-lo em consideração.
Alegro-me que tenha pensado numa fórmula decorosa para estar ali na hora, e escutar ao Secretário Geral das Nações Unidas. E se o senhor pudesse, com a ajuda do Secretário Geral das Nações Unidas, me garantir tomar um turno —não esperaremos tanto tempo ali, quanto mais tempo então mais...— e falo no turno entre o 10 e o 15, depois de começar a lista de oradores, para além do seu discurso, nós falamos com um companheiro que estava ali, lhe daremos instruções —visto que lhe deram a tarefa de gestionar um turno mais cedo—, então estou livre para lhe provocar as menores moléstiàs.
Fox.- Sim.
Ouve, Fidel, de qualquer maneira, está o convite a que me acompanhes no jantar às 13:00 ou 13:30 h, e acabando de comer podes sair.
Fidel.- Sempre e quando não me ponha "mole com guajalote" e muita comida, porque no avião, viajar para cá muito cheio...
Fox.- Não, Há cabrito que é muito gostoso.
Fidel.- Há cabrito?
Fox.- Sim, senhor, excelênte.
Fidel.- Bom, muito bem.
Fox.- Então acordamos isso Fidel?
Fidel.- Acordamos isso e ficamos amigos, como amigos e cavalheiros.
Fox.- Sim, te agradeço muito e me dás a hora da tua chegada para te receber e levar-te a hospedar.
Fidel.- Dar-lhe-ei a hora da minha chegada bom, se quiseres chego mais cedo e assim salvamos muito. A que horas vais para a cama amanhã?
Fox.- Amanhã?
Fidel.- Sim.
Fox.- O que é amanhã, quarta? Amanhã vou para a cama cedo, como bom rancheiro.
Fidel.- Como bom rancheiro. Eu sou o contrario, quase não dormo.
Me diga, qual e a hora que mais lhe convém?
Fox.- Como tu estás colocando as 22:00h, 23:00h, 00:00h, para que te hospedes e possas descansar e estar lá no outro dia de manhã.
Fidel.- Muito bem, de acordo.
Fox.- Então, logo que a Embaixada me der a hora exata estarei ali para te receber como se deve.
Fidel.- Sim, amanhã te darei a hora exata.
Fox.- Com a Embaixada falamos sobre isso.
Fidel.- Como sempre, te agradeço muito essa cortesia, essa honra, se vais ali, acho que ajudaria muito a...
Fox.- Me acompahas ao jantar e dai vais embora.
Fidel.- E dai cumpro suas ordens: regresso.
Fox.- Fidel, te agradeço muitíssimo.
Fidel.- Muito bem, Presidente.
Fox.- Assim vão nos sair bem as coisas.
Fidel.- Acho que sim, agreço-lhe...
Fox.- Bom, igualmente e que tenhas boa noite.
Fidel.- ... Por sua cortesia e por buscar uma fórmula que seja honorável e aceitável.
Fox.- Sim, acho que é e te agradeço.
Fidel.- Muito bem, e desejo-lhe sucessos.
Fox.- Boa noite.
Fidel.- Boa noite.
O senhor Presidente do México tinha dito a última palavra. Era o meu direito incontestável participar nessa Conferência convocada pelas Nações Unidas e não pelo senhor Bush. Mas já não podia viajar a Monterrei contra a votade expressa do Presidente do país sede; tinha que me resignar a usar os seis minutos que me correspondiam, e ir embora despois do almoço, ou antes, se conseguia adiantar o turno número 30 que me correspondia segundo o sorteio, entre outras razões porque não tinha podido assegurar minha presença com antecedência, para evitar a mobilizaçao da matilha de terroristas e assassinos profissionais já mencionados que desde território norte-americano são organizados e pagados para me eliminar físicamente cada vez que viajo a uma evento internacional.
Devo acrescentar que a minha chegada a Monterrei, o senhor Fox não apareceu no aeroporto como tinha prometido sem que eu o solicitasse no absoluto. Nem sequer realizou uma chamada telefónica para uma saudação de cortesia. Em nada me preocupou o assunto. Não gosto dos protocolos nem das cortesias.
No entanto desfrutava de um singular consolo. Ao mesmo tempo que se me ordenava partir imediatamente depois do almoço, em duas ocasiões me anunciou que receberia a imensa honra de sentar-me a seu lado para o mundanal desfrute de um delicioso cabrito.
No entanto, não podia ir da Cimeira sem a menor explicação. Nunca fiz tal coisa em nenhuma delas. O senhor Presidente dos Estados Unidos poderia supor que Cuba temia sentar-se com a testa em alto, ante sua poderosa e augusta presença. Na Cimeira de Rio de Janeiro em 1992, seu próprio pai teve o gesto encomiástico, pelo pouco freqüente, de entrar deliberadamente na sala minutos antes do meu turno, escutar sereno as minhas palavras e inclusive aplaudir tanto ele como a sua delegação ao concluir as mesmas. Há um velho ditado popular que afirma que a cortesia não tira valentia. Ninguém no nosso país, no México ou em qualquer outra parte haveria compreendido tão extranha retirada. Para explicá-la só disse três linhas;
"Peço-lhes a todos me desculpem que não possa continuar acompanhando-vos devido a uma situação especial criada pela minha participação nesta Cimeira, e me vejo obrigado a regressar imediatamente ao meu país."
Não podia dizer menos nem dizê-lo com mais cuidado. Esqueci totalmente o cabrito. Saí da sala e me reuní com o Presidente da Colômbia breves minutos para intercambiar sobre as gestões de paz nesse país. Depois fui a me despedir do Secretário Geral da Organização das Nações Unidas que lógicamente, tinha sido informado do acontecido desde o dia anterior pelo nosso Embaixador nessa instituição. Com ele me esperavam, em evidente atitude solidária Olosegun Obasanjo, presidente da Nigéria e Thabo Mbeki, presidente da África do Sul. Saí e descí por uma escada automática. Frente a esta, nas varandas interiores e áreas laterais, numerosos empregados mexicanos, das Nações Unidas e participantes de outros países no evento aplaudiam em gesto de solidariedade. Um tumulto de jornalistas moviam-se agitadamente fazendo fotos, filmando, esperando alguma declaração. Não disse uma palavra. Assim deixei o edifício.
Atrás não tinha deixado nenhuma complicação insolúvel.
As minhas últimas palavras ao concluir a intervenção foram:
"Chefiando a Delegação de Cuba está o companheiro Ricardo Alarcón de Quesada, Presidente da Assembléia Nacional do Poder Popular, incansável lutador na defensa dos direitos do Terceiro Mundo. Passo a ele as prerrogativas que me correspondiam nesta reunião como chefe de Estado.
"Espero que não lhe proíbam participar em nenhuma actividade oficial às que tem direito como chefe da Delegação Cubana e como Presidente do órgão supremo do poder do Estado en Cuba."
Ali estava ao alcance dos anfitriões, uma solução bem simples. Aceitar a presença de Ricardo Alarcón, chefe da Delegação nas reuniões oficiais da Cimeira, e não se teria falado mais do incidente. Faltava só um mínimo de visão e senso comum. Não sei se a soberba, a arrogância e o espíritu aventureiro do conselheiro áulico do Presidente Fox ou a prepotência de Bush impediram essa saída decorosa.
A essa hora ainda estava em jejum. Fui para o hotelinho onde me hospedava. Ali tinha convidado para almoçar a Hugo Chévez, grande amigo, que também se viu envolvido numa intervenção azarosa e interrrompida pelo ilustre anfitrião mexicano ao falar em nome do Grupo dos 77 e do seu próprio país. O fraterno e relaxado encontro prolongou-se durante horas com intercâmbios sobre variados temas, três semanas antes do abortado golpe fascista contra a Revolução bolivariana. Foi um almoço não suculento mas agradável, com omeletes mexicanas, feijão refrito e outros pratos tradicionais do irmão país que a mim me pareceram mais deliciosos que qualquer cabrito.
Tinha esquecido da hora e da ordem peremptória de ir embora rápidamente depois do almoço. Entretanto Bush levava horas esperando impaciente em El Paso –ubicado na atual fronteira de Estados Unidos com o México, desde a invasão de 1846, quando lhe arrebataram ao país mais da metade do seu território—a notícia de que tão inoportuno participante havia saído do México. Ninguém do protocolo se lembrou ou não quis molestar o disciplinado e obediente, hóspede embora com má memoria que afinal foi embora de Monterrei às 17:00 hrs. Parece que Bush, cansado de esperar, recebeu a permissão ou decidiu por conta própria descolar ou corria o risco de chegar tarde ao jantar.
Alguém estacionou o seu avião junto do velho Il-62 de Cubana. Ao passar no seu carro, com gesto amistoso, saudou à tripulação cubana que já me esperava no alto da escada. Pela minha parte alheio a tais peripécias, me despeço de Chávez, tomo o carro e com o meu pequeno cortejo vou para o aeroporto pela via por onde acabava de cruzar a cauda enorme do cortejo de Bush. Afinal ambos os dois estivemos em Monterrei a uns metros de distância. Ao descolar o nosso avião a tarde era radiante e bela.
Na cidade sede fica a nossa delegação, chefiada pelo Presidente da nossa Assembléia Nacional, acompanhado pelo nosso Ministro dos Negócios Estrangeiros. A lógica indicava que não haveria mais problema. Se excluiria a Ricardo Alarcón dos eventos da Cimeira? Se lhe admitirá ou não no convívio que será no dia seguinte depois do discurso em que o ilustre Presidente dos Estados Unidos "muito democráticamente" duplicaria sem interrupção o tempo asignado aos outros mortais que assistiam à conferência como Chefes de Delegação? Embora parecia-nos absurda, torpe e improvável tal exclusão, lhes encomendei a tarefa, nesse caso, de explicar a verdade mas sem usar nem mencionar a conteúdo e a existência da conversa entre Fox e eu, cujo caráter pessonal desejava manter e destiná-la aos arquivos da Revolução.
Foi um mal sintoma que o senhor Castañeda se precipitasse em afirmar que o protocolo era o protocolo e que não seria violado, criando pretextos, como sempre, para cumprir os compromissos com o governo dos Estados Unidos e ocultar a verdade. Minutos antes da reunião se lhe comunicou ao companheiro Alarcón que não teria nenhum aceso à mesma. Tal como se tinha decidido o chefe da nossa delegação explicou em numerosas conferências de imprensa a verdadeira causa de minha ausência. Entre outras coisas exprimiu:
"Ontem o chanceler Castañeda, em várias oportunidades na sua reunião com a imprensa manifestou que não tinha existido nenhuma gestão de nenhum funcionário autorizado no sentido de obstaculizar a participação de Cuba e sugeriu várias vezes que fosse Cuba quem explicasse o que tinha acontecido, porque ele não tinha elementos. Tenho que dizer que as declarações dele são fundamentalmente falsas.
E acrescentou:
"Nem só funcionários autorizados, senão eu diria que pessoas muito autorizadas do governo do México nos comunicaram, antes da conferência, as pressões de que eram vítimas por parte do governo dos Estados Unidos para que Cuba não participasse na conferência e para que específicamente a delegação não fosse chefiada pelo Presidente do Conselho de Estado o companheiro Fidel Castro."
Castañeda sabe que nós o sabemos e que para nós era muito difícil explicá-lo, mas que se não o fizemos até agora foi porque tratamos de ser construtivos e de persuadir à autoridades mexicanas de que era o mais conveniente para todos encotrarmos uma solução honorável, adequada, que já é impossível, visto que se realizou uma reunião da qual foi excluída arbitrária e ilalmente uma delegação, que não foi convidada, que é a de Cuba.
Dizem que as regras das a Nações Unidas e as regras do país anfitrião são diferentes. Não, na verdade, eu não sou chefe de Estado; mas sou a única pessoa que está em Monterrei em quem o chefe de Estado delegou sua representação e é o único chefe de Estado que em Monterrei foi arbitrariamente excluído de participar no retiro "Não é verdade que Cuba podía estar representanda pelo seu chefe de Estado, porque pediu-se-lhe, de maneira muito clara, muito categórica, que fosse embora do México o antes possível".
Por sua parte o nosso Chanceler, por vía telefônica na sua apresentação na mesa redonda da televisão cubana na tarde do dia 22, exprimiu o seguinte:
"Cuba sabia das pressões, que prévio à Conferencia, tinha estado fazendo sobre o governo mexicano o presidente Bush. O presidente Bush ameaçou com que não viria a Cimeira se nela participava o companheiro Fidel."
Tinha-se produzido o convite do Comitê Preparatório criado pela Assembléia Geral das Naçoes Unidas numa resolução, a carta acaba de conhecer-se através dos dois embaixadores, e depois produziu-se o convite oficial do presidente Fox".
Depois se lhe solicitou ao companheiro Fidel que não viesse à Cimeira, como era o seu direito como chefe de Estado de um país membro das Nações Unidas para participar numa conferência onde Cuba tinha desempenhado um importante papel na sua convocatória."
Essa é a realidade histórica pediram-lhe que não participasse, e foi pedido –como já dissemos—por uma pessoa muito autorizada do governo do México para fazer um pedido dessa magnitude. Pediram-lhe que não viesse e perante a firme posição de Fidel, que defendeu o direito de Cuba de estar soberanamente presente nessa reunião, então pediram-lhe que fosse só na manhã da quinta-feira, e que logo depois do almoço que ofereceria o governador, fosse embora."
"O companheiro Fidel estava na necessidade e no dever de explicar aos delegados e o explicou cuidadosamente e manifestou realmente a razão que lhe impedia estar ali, com discrição e cuidado. E colocou uma solicitação que podia ter sido atendida e que realmente tinha uma lógica, e era que o companheiro Alarcón, Presidente da nossa Assembléia Nacional participasse nas outras atividades da conferência".
"Houve realmente incapacidade para compreender este raciocínio, e uma incapacidade para aceitar uma solicitação razoável."
Castañeda pela sua parte, desmentia frenéticamente as palavras de Alarcón e de Felipe.
Em coletiva de imprensa a 21 de março perante a pergunta de um jornalista que se o governo do México pediu ou sugeriu ao governo de Cuba que o presidente cubano ajustasse a sua agenda para não se encontrar com o presidente Bush, Castañeda respondeu:
"De maneira nenhuma, em nenhum momento nenhum funcionário autorizado do governo do México lhe colocu nenhuma questão desse gênero ou de qualquer outro semelhante, ao governo de Cuba, às autoridades cubanas."
Ante a insistência da imprensa Castañeda respondeu:
Não hove nenhuma pressão, influência, pedido, sugestão, insinuação. Se tivesse meu dicionário de sinónimos, continuaria, visto que de cor não tenho mais; mas Blanche se o senhor tem uma a coloca e lhe dou a mesma resposta.
Ante o programa de Televisão "Zona Abierta" Castañeda reiterou:
"Em nenhum momento houve pressão por parte de nenhum funcionário mexicano a Fidel Castro, para que fosse antes do previsto."
O senhor Fox, a 22 de março em conferência de imprensa conjunta com Bush, ao se lhe perguntar pelas pressões para exluir a Cuba, disse: Não existem. O senhor Fidel Castro fêz sua visita ao México, à conferência da ONU, esteve aqui participou e regressou a Cuba. Não há mais! Assim de simples."
Em entrevista concedida a Joaquin López Doriga e publicada no jornal La Jornada, ao perguntar-se-lhe se era verdade que Fidel Castro foi embora, primeiro, porque o seu governo disse que não viesse; e, segundo, porque quando esteve aqui o senhor lhe disse que fosse embora, Fox respondeu: Não, que eu saiba, não é assim. Seria interesante, oportuno, que nos digam de onde saiu este assunto; acho que Fidel Castro tem a suficiente maturidade, leva tantos anos governando, que não acredito que a ele qualquer coisa como esta impedisse a sua liberdade e a sua vontade. Castro esteve aqui em Monterrei, participou no congresso, na reunião da conferência das Nações Unidas e depois decidiu ir embora. Ninguém o obrigou a ir embora.
Em declarações à televisão azteca a 24 de Março, ao perguntar-se-lhe o quê tinha acontecido comigo, respondeu:
"Assim como foi de repentino o seu aviso de chegada e a sua chegada, que chegou na noite do dia anterior, assim foi a sua saída. Simplesmente, veio, proferiu o seu discurso e apresentação, foi recebido com todas as cortesias no aeroporto,cumprimentei ele a sua chegada igual do que a todos os outros, me despedi dele e foi embora. Assim de simples. O que é que acontece, o que é que há por trás? Não compreendo."
Bush, pela sua parte, afirmava beatíficamente que os Estados Unidos não tinham feito nenhuma pressão sobre o México.
Todos mentiam a destra e sinistra.
Se Castañeda tivesse aberto o dicionário de sinónimos onde devia, haberia encontrado que mentir equivale a: aldrabar, cabortar, contrafazer, degenerar, engonar, equivocar, faltar à verdade, adulterar, errar, patranhar, ocultar, simular, impor, largar, pataratear, iludir, falsar, fabular, fingir, potocar, etc... etc.
Duvidou-se da credibilidade do nosso país. De acordo com uma enquête, quase a metade dos mexicanos foram induzidos a desconfiar da veracidade de Cuba.
No editorial do Jornal Granma do passado 26 de março advertiu-se: "Cuba tem provas irrefutáveis de todo o acontecido que varreriam cualquer dúvida. Preferiu não usá-las, porque não deseja prejudicar o México, não deseja danar o seu prestigio, não deseja criar desestabilização política nesse irmão país. De alguma maneira, pela honra do México, se deve pôr fim a tais ofensas e agressões ao povo cubano. Que não se obrigue a Cuba a apresentar as provas que temos."
O referido editorial conclui afirmando:
"Não pedimos outra coisa que o cessar das provocações, insultos, mentiras e macabros planos do senhor Castañeda contra Cuba. Contrariamente não haverá outra alternativa que divulgar o que não temos querido divulgar e fazer pó os seus falsos e cínicos pronunciamentos, custe o que custar. Nnguém duvide!"
A palavra desestabilização foi empregue porque o aventureiro chanceler mexicano arrastou na sua perfídia nada menos que ao Presidente do México. Não podiam ser utilizadas nossas provas sem implicá-lo. Talvez isto os levou ao erro de acreditar que nos resignariamos ao golpe sem que se abrisse a caixa de Pandora. Um país bloqueado pelo gigante que hoje inspira tanto medo e ameaça o mundo com seus mísseis e caça-bombadeiros cujos governos arbitrários incluem de forma cínica e caluniosa a nossa Pátria entre os países que apoiam o terrorismo, não podia se atrever a tanto.
Mas nem assim desejávamos tirar as nossas provas. Guardamos silêncio até mais além do que permitiam a ética e a verdade. No entanto faltava a gota que encheu o copo.
Na quarta-feira 10 de abril, o desmelhorado e abjeto Judas que preside o Uruguai assumindo o pouco glorioso papel de lacaio que vinha desempenhando a República Tcheca, apresentou ante a Comissão de Direitos Humanos o invento contra Cuba concebido e forjado com Washington pelo chanceler Castañeda.
Há algo mais —aqui entre parêntese—, até fomos ameçados com romper relações, um governo em que um ministro de saúde assassino permitiu que morressem crianças simplesmente para não adquirir as vacinas de Cuba, único país que as produzia com as quantidades adequadas, segundo informou o instituto francês "Pasteur", ao responder a uma consulta do Uruguai. Realmente estamos ante essa ameaça, só nos resta responder o que é que esperam para fazê-lo.
Isso não impedirá que as nossas vacinas cheguem, porque estando já a necessidade deum novo lote, o mesmo dia em que aquele infame projeto foi apresentado contra Cuba em Genebra pelo governo uruguaio, às 15:00 hrs saía de Havana um avião cubano com 200 000 doses doadas por Cuba.
Nós estávamos realmente tão indignados quando aparece o primeiro surto que tinha sido possivel prevenir e se soube a histórica do que tinha acontecido. Dissemos ao povo uruguaio que estávamos dispostos a lhe doar as vacinas. A finais de dezembro passado necessitavam nesse momento 71 000 doses. Esas vacinas foram tiradas e enviadas da nossa reserva de vacinas. Insto foi há 15 semanas, quando surgiu um surto num povoado do interior. Há pouco tempo o surto apareceu na capital. Em 7 de abril enviamos de imediato 200 000 doses já produzidas anteriormente. Até assumimos os gastos de transportação. Depois surgiram discussões, porque querem negar que se trata de una doação e insistem de todas maneiras em descontá-la duma velha dívida.
Sim, temos uma velha dívida, não é miuto grande, nem algo que atualmente não possamos enfrentar, em maior ou menor tempo. Esse não pagamento se produz quando surge o período especial, depois do derrubamento do campo socialista e a URSS e quando o governo dos Estados Unidos, aliado, isto é, amo do governo uruguaio, acentua e fortalece o seu bloqueio. Onze milhões de cubanos são testemunhas do que isso significou.
Dissemos que estamos dispostos a discutir essa dívida quando quiserem; mas não desejamos, e ninguém pode nos impor que tal doação não é uma doação, senão um pagamentao de dívida. Jamais pagariamos uma dívida com a nossa reserva de vacinas.
Não é um invento. Há uma tradição que o mundo conhece do nosso país e da nossa política. Não andamos com mentiras nem demagogias, e nos negamos com todo o direito a que se ultraje a nossa doação. Realmente uma miséria humana. E digo que se rompem as relações, chegarão pontualmente as restantes vacinas, talvez 800 000 doses, salvo se não quiserem que o avião não aterre ali, porque às 00:00 hrs de 21 a 22 de abril, horas depois da facada de Genebra, chegaram a Montevidéu as 200 000 doses do terceiro lote de vacinas e estão prontas todas as outras.
Dois mil e seiscentos médicos cubanos prestam serviço gratuitamente em países do Terceiro Mundo a través do Programa Integral de Saúde, como ajuda de Cuba a eses países. Não vou mencioná-los mas não é como pagamento de dívida nenhuma, nem o nosso povo toma vingança pelas coisas que fizeram a Cuba nos primeiros anos da Revolução quando todos os governos latino-americanos se entregaram aos Estados Unidos, salvo o México, que tão terrível e doloroso papel desempenha agora à cabeça doutra grande traição a Cuba, como a que lhe fizeram naqeles tristes e vergonhosos anos de covardia e entreguismo. Os Estados Unidos distribuiu entre eles a nossa cota de açúcar, 4 milhões de toneladas aproximadamente, com preço diferente.
Desta vez, felizmente, alguns não se somaram à pérfida conjuração. Temos que recordar toda essa história, e que nós não pagamos dívida com o nosso sangue. Com o nosso sangue pagamos únicamente as dívidas que temos com a humanidade: Os nossos elementares deveres de solidariedad com outros povos.
É ruim e miserável essa política do governo uruguaio. E Cuba não pode ser ameaçada, ninguém a pode ameaçar. Tem vivido 43 anos ameaçada pelo gigante, que hoje é três vezes mais forte do que antes. Resistimos e continuaremos a resistir com a nossa honra, a nossa vergonha e a nossa consciência, que é o único capaz de explicar a sobrevivência do nosso país e sua revolução.
Desculpem por este parêntese.
Em 15 de abril a Presidência do México emitiu um comunicado oficial onde informa que o México votará a favor do projeto apresentado por Uruguai.
Era uma decisão que conhecemos vários dias antes. Respondia a um acordo conciliado com os Estados Unidos. O mais grotesco é que até quiseram nos subornar e compar o nosso silêncio sobre o acontecido em Monterrei.
No meio dos dramáticos acontecimentos ocorridos na Venezuela, quando a vida de Hugo Chávez corria mortal perigo e todo parecia acabado, o Embaixador do México em Cuba, a quem não culpo, trasmitia na tarde de 13 de Abril, aproximadamente 38 horas antes do comunicado oficial do dia 15, uma mensagem do governo mexicano prometendo que "Petróleos Mexicanos" podería assumir os fornecimentos venezuelanos que deixaria de entregar PDVSA.
Repugnava-nos a cínica manobra de engano com a que pretendiam neutralizar nosso protesto contra a malfeitoria que ian cometer em Genebra. O governo do México sempre esteve oposto sistemáticamente a que Cuba recebesse algum beneficício de Acordos como os de São José e outros. Lhes agradecemos friamente e não mostramos o menor interesse pela hipócrita oferta.
A promessa de não patrocinar, promover, nem apoiar uma resolução contra Cuba, quer de Castañeda quer do presidente Fox durante a sua visita a Cuba, tinha sido vilmente traída.
Ainda pode acontecer que alguns dos que me escutam digam: Muito bem, todo está explicado de manera aparentemente lógica e articulada, porém quem garante que Castro considerándo-se un êmulo de Shakespeare, não tenha inventado este drama? Para os que assim pensam, peço-lhes escutar durante poucos minutos a gravação onde constam as palavras precisas, com o tom e ênfase exatos das vozes de Fox e minha.
Os presentes nesta conferência, se o desejarem, podem chamar logo a Fox e Castañeda. Perguntar-lhes se existiu o não esta convesa a 19 de Março entre as 23:30 hrs e as 23:50 hrs aproximadamente, se o reconhecem e se são ou não exatas estas palavras. Se se provasse que tal conversa nunca se produziu e que estas não são as palavras do presidente Fox, me comprometo a renunciar imediatamente a todos os meus cargos e responsabilidades como dirigente do Estado e da Reolução Cubana. Não teria vergonha para continuar dirigindo con honra este país.
Gostaria, no entanto, que os autores de tantas mentiras e do colossal embuste com o que quiseram manipular e enganar ao povo mexicano e a opinião pública mundial, fossem capazes de reagir com o mesmo sentido da dignidade e honra.
Os povos não são massas desprezíveis às que se pode enganar e governar sem ética pudor e respeito.
Por dizer estas verdades, as relações diplomáticas se poderão romper, mas os vínculos fraternos e históricos entre os povos do México e Cuba serão eternos.
22 de Abril de 2002