REFLEXÕES DO
COMANDANTE-EM-CHEFE
O CANDIDATO REPUBLICANO
(Quinta e última parte)
Os artigos aos
quais fiz referência na reflexão de ontem, 14 de fevereiro, foram escritos
durante os últimos dois ou três dias.
Há mais de duas
semanas, no dia 27 de janeiro de
Friedman foi o
mais ativo defensor do neoliberalismo econômico contrário a qualquer regulação
governamental. Suas idéias nutriram Margaret Thatcher, e Ronald Reagan. Membro
ativo do Partido Republicano assessorou Richard Nixon, Ronald Reagan e Augusto
Pinochet, com uma história sinistra. Morreu
em novembro de 2006 aos 94 anos. Escreveu numerosas obras, entre elas Capitalismo e Liberdade.
Quando falo do artigo
de Chalmers Johnson, utilizo estritamente os argumentos incontestáveis
utilizados por ele. Uso o método de selecionar textualmente parágrafos
essenciais.
“Quando chega o
ano 2008, os próprios Estados Unidos encontram-se em uma posição anômala de não
conseguir pagar devido a seus próprios altos níveis de vida ou pelo seu
esbanjador, exageradamente grande, establishment
militar. Seu governo nem sequer tenta reduzir as ruinosas despesas de sustentar
enormes exércitos permanentes, substituir equipamentos que foram destruídos ou
gastados em sete anos de guerra, ou de
preparar uma guerra no espaço exterior contra adversários desconhecidos. No seu
lugar, o governo de Bush adia esses custos para que sejam pagos — ou rejeitados
— por futuras gerações. Esta irresponsabilidade fiscal foi disfarçada usando
numerosas armadilhas financeiras manipuladoras — como é fazer com que países
mais pobres nos emprestem somas de dinheiro sem precedentes —, porém
rapidamente chega o momento de ajustar contas.
“Houve três
amplos aspectos em nossa crise da dívida. Primeiro, neste ano fiscal de 2008
estamos a gastar quantidades desmedidas de dinheiro em projetos de ‘defesa’ que
não têm nada a ver com a segurança nacional dos Estados Unidos.
Simultaneamente, mantemos os impostos sobre as receitas dos setores mais ricos
da população estadunidense a níveis surpreendentemente baixos.
“Em segundo
lugar, continuamos a crer que podemos compensar a erosão acelerada de nossa
base manufatureira e nossa perda de postos de trabalho a países estrangeiros
através de maciças despesas militares...”
“Terceiro, em
nossa devoção pelo militarismo, deixamos de investir em nossa infra-estrutura
social e noutros requerimentos para a saúde de nosso país em longo prazo...”
“Nosso sistema
de educação pública deteriorou-se de maneira alarmante. Não garantimos o
atendimento sanitário de todos nossos cidadãos e não assumimos nossa
responsabilidade como contaminador número um do mundo. E o que é ainda mais
importante: perdemos nossa competitividade como fabricantes para necessidades
civis — um uso infinitamente mais eficiente de recursos escassos do que a
fabricação de armas...”
“É virtualmente
impossível exagerar o esbanjamento que constituem as despesas de nosso governo
nas forças armadas. As despesas planejadas pelo Departamento de Defesa para o
ano fiscal de 2008 são maiores do que o resto dos orçamentos militares
combinados. O orçamento suplementar para pagar pelas atuais guerras no Iraque e
no Afeganistão é maior do que os orçamentos militares combinados da Rússia e da
China. As despesas relacionadas com a defesa para o ano fiscal de 2008, pela
primeira vez, ultrapassarão o milhão de
milhões de dólares, e os Estados Unidos tornaram-se o maior vendedor por si
próprio de armas e munições a outras nações na Terra...”
“As cifras
publicadas pelo Serviço de Referência do Congresso e pelo Escritório do
Orçamento do Congresso não coincidem entre elas...”
“Existem inúmeras razões para esta
prestidigitação orçamentária — incluindo a vontade de manter o segredo por
parte do Presidente, do Secretário de Defesa, e do complexo militar-industrial
—, contudo o motivo principal é que membros do Congresso, que se beneficiam
enormemente dos postos de trabalho na defesa e de projetos oportunistas para
tentar conquistar simpatia nos eleitores de seus distritos, têm um interesse
político no apoio ao Departamento de Defesa...”
“Por exemplo, 23.400 milhões de dólares para
o Departamento de Energia são utilizados no desenvolvimento e manutenção de
ogivas nucleares; e 25.300 milhões de dólares no orçamento do Departamento de
Estado são despendidos na ajuda militar ao estrangeiro...”
“O Departamento de Assuntos de Veteranos recebe
atualmente pelo menos 75,700 milhões de dólares, 50 por cento dos quais são
utilizados no atendimento em longo prazo dos terrivelmente feridos, entre eles
pelo menos totalizam 28.870 os soldados feridos até agora no Iraque e 1.708 no
Afeganistão.
“Outros 46.400 milhões de dólares são
destinados ao Departamento de Segurança Interior; 1,900 milhões de dólares ao
Departamento da Justiça para as atividades paramilitares do FBI; 38.500 milhões
de dólares para o Departamento do Tesouro destinados ao Fundo de Aposentadoria
das Forças Armadas; 7.600 milhões para as atividades relacionadas com as forças
armadas da NASA; e ainda mais de 200.000 milhões em juros por passados
desembolsos financiados com dívidas. Isto leva as despesas dos Estados Unidos
para seu establishment militar durante o atual ano fiscal (2008), calculados de
maneira conservadora, em pelo menos 1,1 milhão de milhões de dólares.
“Estas despesas não são apenas obscenas
desde o ponto de vista moral, mas também são insustentáveis desde o ponto de
vista fiscal. Numerosos neo-conservadores e estadunidenses patrióticos mal
informados acham que, inclusive se nosso orçamento de defesa é imenso, podemos
fazê-lo porque somos o país mais rico da Terra... Essa declaração já carece de
valor. A entidade política mais rica do mundo, segundo o Livro mundial de dados, da CIA, é a União Européia. O PIB da União Européia
em 2006 foi calculado como ligeiramente superior ao dos Estados Unidos. O PIB da
China em 2006 foi só ligeiramente inferior ao dos Estados Unidos, e o Japão foi
o quarto país mais rico do mundo.
“Uma comparação mais convincente, que revela
até que ponto vamos empiorando, pode ser encontrada nas ‘contas correntes’ de
varias nações. A conta corrente mede o superávit comercial neto ou déficit de
um país, porém os pagamentos internacionais de interesses, royalties,
dividendos, capital de lucros, ajuda estrangeira, e outras receitas. Para que o
Japão possa fabricar alguma coisa, deve importar todas as matérias-primas
necessárias. Depois de fazer esse gasto incrível, ainda assim atinge um
superávit comercial de 88.000 milhões de dólares cada ano com os Estados Unidos
e possui o segundo balanço de conta corrente do mundo por seu tamanho. A China
é o número um. Os Estados Unidos são o número 163 — o último da lista, pior que
países como Austrália e o Reino Unido, que também têm grandes déficits
comerciais. Seu déficit de conta corrente em 2006 foi de 811.500 milhões de dólares;
o segundo pior foi o da Espanha com 106.400 milhões de dólares. Isto é insustentável...”
“Nossas excessivas despesas militares não se
desenvolveram só em uns poucos anos. Fizeram-no durante muito tempo
acompanhando uma ideologia superficialmente plausível e agora começam a fazer
estragos. Chamo-a de ‘keynesianismo militar’. É
a determinação de manter uma economia de guerra permanente e de tratar a
produção militar como se fosse um produto econômico ordinário, embora não faça
nenhum contributo à produção nem ao consumo...
“A Grande Depressão dos anos trinta foi
ultrapassada só devido ao auge da produção de guerra da Segunda Guerra
Mundial...
“Com este conceito, os estrategistas
estadunidenses começaram a criar uma maciça indústria de munições, tanto para
neutralizar o poder militar da União Soviética — o qual foi exagerado
consideravelmente por eles — quanto para manter o total emprego e prever um
possível retorno da Depressão. O resultado foi que, sob a liderança do
Pentágono, foram criadas indústrias completamente novas para fabricar grandes aviões,
submarinos nucleares, ogivas nucleares, mísseis balísticos intercontinentais,
além de satélites de vigilância e de comunicações. Isto levou aquilo contra o
que foi advertido pelo presidente Eisenhower em seu discurso de despedida em 6
de fevereiro de 1961: ‘A conjunção de um imenso establishment militar e de uma grande indústria de armamentos é
nova na experiência estadunidense’ — isto é, o complexo militar-industrial.
“Em 1990, o valor das armas, do equipamento
e das fábricas dedicadas ao Departamento de Defesa representava 83 por cento do
valor de todas as fábricas e equipamentos na manufatura estadunidense...”
“A dependência dos Estados Unidos do keynesianismo militar progrediu apesar
de que a União Soviética já não existe...”
“A devoção ao keynesianismo militar é, de fato, uma forma de lento suicídio
econômico...”
“O historiador Thomas E. Woods, Jr., faz a
observação de que, durante os anos cinqüenta e sessenta, entre um e dois terços
de todo o talento de pesquisa estadunidense foram desviados para o setor
militar...
“Entre
os anos quarenta e 1996, os Estados Unidos gastaram pelo menos 5,8
milhões de milhões de dólares no desenvolvimento, ensaio, e construção de
bombas nucleares. Em 1967, o melhor ano do arsenal nuclear, os Estados Unidos
possuíam perto de 32.500 bombas atômicas e de hidrogênio movediças...”
“As armas nucleares não foram só a arma
secreta dos Estados Unidos, senão também sua arma econômica secreta. Em 2006,
ainda tínhamos 9.960 (das mais modernas). Atualmente não existe um uso
judicioso para elas, enquanto os milhões de milhões que foram gastados nas
mesmas puderam ter sido utilizados para solucionar os problemas de previdência social e
atendimento sanitário, educação de qualidade e acesso à educação a todos, para
não falar da retenção de postos de trabalho altamente qualificados dentro da
economia estadunidense...”
“Nosso breve exercício como a ‘única
superpotência’ do mundo acabou.
“... atualmente já não somos o principal
país emprestador do mundo. Realmente agora somos o maior país devedor do mundo,
e continuamos a exercer influência só sobre a base de proezas militares.
“Parte do prejuízo causado jamais poderá ser
emendado.
“Há alguns passos que devem ser dados
urgentemente por este país. Incluem a anulação dos cortes de impostos de Bush
para os ricos, dos anos 2001 e 2003; que comecemos a liquidação de nosso
império global de mais de 800 bases militares, que eliminemos do orçamento de
defesa todos os projetos que não estejam
relacionados com a segurança nacional dos Estados Unidos e que cessemos a
utilização do orçamento de defesa como um programa keynesiano para a criação de
empregos. Se conseguimos fazer isso teremos a possibilidade de nos libertar por
um triz. Se não o fazemos, enfrentamos a provável insolvência nacional e uma
longa depressão.”
Numa consulta feita na Internet sobre a obra
de Johnson, a resposta já está desenhada para ele. O que expressa? Algo que
explico em muito apertada síntese:
“Johnson argumenta que os Estados Unidos são
seu pior inimigo. ‘Mais cedo do que tarde, garante ele, que a arrogância dos
Estados Unidos provocarão sua queda’. O livro de Johnson está formado em grande
medida por capítulos autônomos sobre um número de temas pouco relacionados.
“’O tempo para evitar a falência financeira
e moral é curto’. Mais tarde, chega à seguinte conclusão: ‘Estamos à beira de
perder a democracia em prol de manter nosso império’. As obras de Johnson são
descritas como ‘polêmicas’... Enquanto muito de nos viramos insensíveis perante
as atrocidades da Casa Branca, a indignação de Johnson com a Administração —
seus memorandos da tortura, seu desprezo pela livre informação pública, sua
burla dos tratados estabelecidos — é vívida. Isto pode ter sua origem em seus
antecedentes conservadores: tenente da Marinha na década dos anos cinqüenta,
assessor da CIA de
“’Há muitos anos podia-se traçar a expansão
do imperialismo através da contagem de colônias’, escreve Chalmers Johnson em Némesis: os últimos dias da república
estadunidense. ‘a versão norte-americana da colônia é a base militar...’
“Némesis
é um livro que trata sobre o poder duro. Ao equiparar as longínquas bases dos
estados Unidos com as guarnições de Roma, Johnson postula que as coisas não
mudaram muito desde os dias de César e Octavio. Mas, com as armas nucleares
espalhadas pelas grandes e menores potencias, o poderio militar apenas pode
conseguir a destruição mútua... Nossas tropas estão assediadas.”
“ Cada um dos eruditos capítulos de Johnson
ensina tanto quanto perturba. Porém sua jeremiada subjacente no que respeita à
morte da democracia, carece de força analítica. Johnson olha de maneira
incrédula ‘aos que acham que a estrutura de governo no Washington de hoje tem
algum parecido com o que foi esboçado na Constituição de
“Esse pessimismo parece exagerado. A
República sobreviveu a Richard Nixon e a Edgar J. Hoover, e à democracia,
apesar dos golpes recebidos, sobreviverá também a Bush.”
Os argumentos para responder concretamente
ao artigo assinado por Johnson no dia 27 de janeiro requerem algo mais do que
uma declaração de fé na democracia e na liberdade. Johnson não inventou a
Aritmética, que até um aluno da sexta classe conhece; também não foi inventada
pelo grande poeta chileno Pablo Neruda, também Premio Nobel. Esteve muito perto
de não obter um título universitário: perguntava constantemente — narra seu
biógrafo — quanto era oito vezes cinco; jamais lembrava que era quarenta.
Há vários meses, analisando minuciosamente
mais de 400 páginas da tradução das memórias de Alan Greenspan, quem foi
durante 16 anos Presidente da Reserva Federal dos Estados unidos, A era da turbulência — sobre a qual
prometi escrever algumas reflexões e já é água passada —, aprendi a conhecer o
segredo de suas enormes inquietações: o que começa a acontecer na atualidade.
Em essência, compreendia com clareza as conseqüências, terríveis para o
sistema, de imprimir notas e gastar sem limites.
Não enfrentei deliberadamente nenhum dos
candidatos de ambos os partidos ao delicadíssimo tema da mudança climática para
não perturbar ilusões e sonhos. A publicidade nada incide nas leis físicas e
biológicas. Estas são menos compreensíveis e mais complicadas.
Há alguns meses expressei a certeza de que
aquele que conhecia mais sobre o tema da mudança climática e possuía maior
popularidade não aspiraria à
Presidência. Já o tinha sido e lhe arrebataram a vitória através de uma
escandalosa fraude. Compreendia os riscos da natureza e da política. É lógico
que estou a falar de Albert Gore. É um bom termômetro, haverá que lhe perguntar
cada dia como dormiu. Suas repostas
serão sem dúvida úteis para a desesperada comunidade científica; ela deseja que
a espécie sobreviva.
Na próxima reflexão tratarei um tema de
interesse para muitos compatriotas, mas não adianto nenhum dado.
Peço desculpas aos leitores pelo tempo e
pelo espaço que ocupei durante cinco dias com O Candidato Republicano.
Fidel Castro Ruz
15 de fevereiro de 2008
20h26