Mesa-redonda "Os intelectuais e artistas cubanos contra o fascismo", efetuada nos estúdios da Televisão Cubana, em 14 de abril de 2003, "Ano dos gloriosos aniversários de Martí e do Moncada".

(Versões Taquigráficas – Conselho de Estado)

Randy Alonso – Muito boa tarde, estimados telespectadores e ouvintes.

Em momentos dramáticos e extremamente perigosos para a humanidade, quando o fascismo ressurge com a pretensão de exercer seu brutal domínio sobre o planeta, os intelectuais e artistas cubanos convocaram a criação de uma frente antifascista internacional.

Desenvolvemos nesta tarde a mesa-redonda "Os intelectuais e artistas cubanos contra o fascismo", em que me acompanham relevantes figuras de nossa cultura.

Estão no painel, nesta tarde, o companheiro Carlos Martí, poeta e presidente da União Nacional de Escritores e Artistas de Cuba; Roberto Fernández Retamar, poeta, ensaísta, Prêmio Nacional de Literatura e presidente da Casa das Américas.

Temos também a honra de contar com Pablo Armando Fernández, poeta, novelista, escritor e intelectual cubano e Prêmio Nacional de Literatura; Julio García Espinosa, um de nossos mais destacados cineastas, diretor da Escola Internacional de cinema de San Antonio de los Baños; Elíades Acosta, historiador, intelectual cubano e diretor da Biblioteca nacional "José Martí"; e Fernando Martínez Heredia, um de nossos mais destacados ensaístas, presidente da cátedra "Gramsci" do centro "Juan Marinello", do Ministério de Cultura.

Convidados, no estúdio, compartilham conosco hoje diversas personalidades da arte e da intelectualidade cubana; companheiros do Pólo Científico, do Ministério de Turismo, crianças do grupo teatral La Colmenita e, de maneira especial, acompanha-nos, nesta tarde, Abel Prieto, ministro de Cultura de nosso país.

(Passam imagens do tema)

Randy Alonso – O Conselho Nacional da UNEAC, que se reuniu, no fim de semana, na capital cubana, divulgou uma declaração chamando à criação de uma frente antifascista.

Carlos Martí, por que esse chamado dos intelectuais cubanos, como se produziu, quais são as bases em que se sustenta essa convocação dos intelectuais e artistas de Cuba.

Carlos Martí – De fato, nesse momento que estamos vivendo, essa convocação é imprescindível. É um momento de extrema gravidade para nosso país e, é claro, essencialmente para a humanidade, pois se ativou uma maquinaria neofascista que já colhe os resultados de uma guerra de rapina contra o povo do Iraque. Ou seja, tornou-se imprescindível que nos reuníssemos, que refletíssemos sobre o momento atual, e finalmente chegássemos a um documento, como o que se aprovou ali, no Conselho Nacional, que vamos lançar ao mundo inteiro.

Quero mencionar alguns dos aspectos essenciais deste documento e da reflexão que escritores e artistas fizemos.

Primeiro, é preciso assinalar – como se coloca no documento – que esse neofascismo tem pretensões universais, e o perigoso é que não tem opositores armados, nem muro de contenção, nem nenhum tipo de força capaz de brecá-lo. Além disso, tem um poder devastador, capaz de aniquilar um país em questão de minutos. Este é um primeiro aspecto que o documento assinala.

O segundo aspecto que quero sublinhar é que o critério intervencionista que vem sendo imposto pelos Estados Unidos viola todos os acordos em matéria de Direito Internacional e pretende arrasar os irrenunciáveis princípios de soberania e autodeterminação dos povos.

Nosso povo pôde ver com toda a clareza como se impôs a guerra, apesar de não haver sido aprovado nas Nações Unidas.

Também se afirma no documento que está presente, hoje, a fatídica substituição do império da lei pela lei do império. Essa é uma afirmação muito importante, que está contida no documento em questão.

Um terceiro aspecto é a máquina de propaganda que se acionou; ou seja, a força da mídia. Todos os meios modernos, em função de apresentar os invasores como "forças libertadoras" ou como "coalizão" – uma palavra que tem certa nobreza –, e tratar de impor ou anunciar um critério supostamente democrático, quando, na realidade, nós vemos que o que ocorreu ali é o mais brutal genocídio. Isso não é nenhuma coalizão. São simplesmente as forças imperiais que desataram, unilateralmente, essa agressão contra o povo iraquiano.

Essa máquina, como se sabe, inunda cotidianamente o planeta, reiterando a mensagem de superioridade dos Estados Unidos e o papel messiânico que lhes é atribuído. Complementa-se, sem dúvida, com uma visão que nos converte, no Terceiro Mundo, a tudo o que não é Estados Unidos, ao outro, numa caricatura. Realmente é parte dessa máquina neofascista, que se foi acionando e se pôs em prática com a guerra do Iraque.

No entanto, apesar da enorme influência da mídia, foi abrindo caminho uma consciência antibélica, e vimos todos os dias, através das mesas-redondas e das informações que foram divulgadas, como essa consciência antibélica e antiimperialista conseguiu levantar os povos, vemos grandes manifestações em todas as partes do mundo e o setor intelectual, precisamente, também se levantou no mundo.

O manifesto "Não em nosso nome", assinado pelos mais importantes intelectuais norte-americanos, é prova disso.

É justo recordar também que nós, em todo esse tempo em que estivemos trabalhando contra a guerra, e tratando de refletir sobre esse fenômeno neofascista, distinguimos perfeitamente que uma coisa é o governo dos Estados Unidos, que está atuando dessa maneira, e outra coisa é o melhor da cultura norte-americana e seu povo; de maneira que recordamos que a UNEAC, em 4 de julho do ano passado, celebrou a independência norte-americana, tratando de distinguir entre o governo imperialista, a máquina neofascista, e a grande cultura norte-americana, que está representada, exatamente, por aqueles que firmaram o documento "Não em nosso nome". Trata-se, portanto, de várias ações que se empreenderam.

Posso mencionar também que, quando começou a guerra, fizemos uma oficina "Não à guerra" na sede da UNEAC e nas províncias, e por elas passaram escritores e artistas, emitindo suas opiniões contrárias à guerra e trabalhando junto com a população que se reuniu ali.

Essa oficina abriu-nos o caminho para o Conselho Nacional e para levar a luta e abrir a reflexão sobre esse programa neofascista.

Outro aspecto que esse documento coloca é que, depois do que ocorreu, de maneira repudiável, em 11 de setembro, aqueles fatos se converteram num pretexto para implantar uma política preconcebida de dominação e saqueio universais. Pessoalmente, considero uma autoprovocação, um gigantesco Maine, para impor esse tipo de agressões ao mundo.

Ou seja, que a pretensa luta contra o terrorismo facilitou um desdobramento sem precedentes em armas e recursos, um esplêndido negócio, que sempre foi o sonho do complexo militar-industrial.

Estamos diante de um despojo dos recursos do mundo, das riquezas dos povos; mas, ainda pior que na época colonial, porque as armas são mais sofisticadas, e estão nas mãos da maior potência imperial já vista; a situação, portanto, é realmente crítica.

Esses aspectos estão contemplados em nosso documento, e o que denunciamos, essencialmente, é o sinistro propósito de implantar ou impor uma tirania mundial neofascista. Esse é um conceito que fica claro.

Os escritores e artistas cubanos nos pronunciamos por semear idéias, semear consciência, como foi proclamado no 150Ί aniversário natalício de José Martí.

Creio que as sessões de nosso Conselho nacional foram verdadeiramente memoráveis e que não ficarão nisso; mais adiante, falarei sobre um programa de trabalho, temos de concretizar as decisões desse Conselho Nacional.

Recordo uma excelente intervenção feita ali pela doutora Graciella Pogolotti, quando afirmava que se avançou muito na denúncia do programa de globalização neoliberal no terreno econômico; mas que é preciso, igualmente, avançar no desmonte do pensamento da ultradireita e sua doutrina neofascista. Recordei também um incidente em que um conhecido nazista, no ano de 1936, fez uma brutal afirmação: "Quando ouço a palavra cultura, pego meu revólver", e temos aqui presente o Roberto Fernández Retamar, que, no Congresso Cultural de Havana, em 1968, contestou a essa afirmação fascista para todos os tempos, com uma afirmação humanista para todos os tempos: "Quando ouço a palavra fascismo, pego minha cultura". Ou seja, agora temo de mobilizar o talento, as idéias, o pensamento. A reflexão deve impor-se, abrir caminho, para que realmente possamos criar uma frente antifascista em escala universal.

Randy Alonso – Uma frente, Carlos – como diz o documento –, que tem de enfrentar o programa expansionista que fundamenta essa agressão e que foi elaborado pela ultradireita norte-americana, herdeira do pensamento daqueles que – em sua época – José Martí, com assombrosa visão histórica, denunciou. Essa posição da intelectualidade cubana tem sua semente e sua base no pensamento de nosso Herói Nacional.

Sobre a política imperial norte-americana, a reflexão feita por José Martí, há mais de um século, é a opinião em nossa mesa-redonda do destacado estudioso da obra de Martí e grande intelectual cubano, Cintio Vitier.

Cintio Vitier – Vamos fazer algumas considerações sobre a forma como José Martí viu a política norte-americana.

Todos sabemos quais eram os Estados Unidos que Martí admirou e quis. Bem, os Estados Unidos de Lincoln, a quem ele chamou de lenhador de olhos piedosos; dos grandes poetas, dos grandes pensadores norte-americanos; dos lutadores sociais, dos abolicionistas, sem dúvida; dos filantropos, dos índios e dos negros.

Como exemplo do que dizemos, de como ele viu a política já em seu tempo e como previu seu futuro, temos um artigo de 1885 realmente surpreendente, intitulado: A política de assalto, onde diz coisas como estas:

"... esses novos tártaros, que vagueiam e devastam à moda moderna, montados em locomotivas; esses colossais rufiões, elemento temível e numeroso desta terra sangüínea, empreendem sua política de pugilato, e, recém-chegados da selva, vivem na política como na selva, e onde vêem um fraco comem dele, e veneram em si a força, única lei que acatam, e se olham como seus sacerdotes, e como com certa superior investidura e inato direito a tomar quanto alcance sua força".

Esta é realmente, a raiz desse tipo de política que foi, sem dúvida, intensificando-se até os nossos dias; mas, ao mesmo tempo, Martí, alguns anos depois, a propósito dos planos que ele previa que estavam sendo preparados para a intervenção dos Estados Unidos na guerra de Cuba, na guerra que ele estava organizando, isso já no ano de 1889, refere-se a esses planos e diz:

"Coisa mais covarde não há, nos anais dos povos livres, nem maldade mais fria". Aqui ele já percebe outro elemento que irá se apoderando da política norte-americana, que é o da frieza, da astúcia, e isso nos recorda e nos estremece pensar no aforismo, na sentença de José de la Luz y Caballero: "A frieza, matéria-prima da maldade".

É evidente que as previsões martianas acerca do chamado destino manifesto estão atingindo, em nossos dias, uma confirmação catastrófica, à parte de que, realmente, sentimos a possibilidade de um contrapeso esperançoso na parte mais saudável do povo norte-americano: na consciência de seus intelectuais, de seus artistas, que, ademais, estão somando-se, indiscutivelmente a um clamor, pela primeira vez universal, contra a guerra.

Percebe-se, cada vez mais, a magnetização de uns sucessos com outros.

A brilhante intervenção de nosso Ministro das Relações Exteriores, diante do Conselho Nacional da UNEAC, mostrou e demonstrou a astuta, fria e não por isso menos instintiva planificação da superpotência, que se propôs apoderar-se do planeta como de um todo indistinto.

Já a política de assalto vai se convertendo em política de arrasamento, e diante desses sucessos e dessa situação pavorosa em escala mundial, não é exagerado denunciar sua entranha fascista ou nazi-fascista, como ontem nos dizia Fidel, com a agravante de uma hipocrisia, filha, precisamente, da frieza, que não foi praticada por Hitler nem por Mussolini.

A bandeira que agora se alça como pavilhão do luto universal é nada menos que a "democracia". Ao cerrar fileiras numa frente internacional antifascista, como se propõe nesta declaração, neste documento da UNEAC, comprometem-nos nossos heróis, nossos mártires, nossos pensadores, nossos artistas, nossos poetas fundadores, enquanto porta-vozes e parte essencial de nosso povo; eles já são, de fato, desde Varela, passando por Martí até nossos dias, essa frente em nós, dentro de nós. Eles também nos impulsionam a crer, com Martí, no melhoramento humano, impedindo em nossos atos – e isso me parece essencial – toda mancha de ódio e nos pondo a cada dia mais a serviço dos pobres da terra.

Randy Alonso – Retamar, Cintio Vitier evocava a raiz dessa posição dos intelectuais cubanos, que nos vem desde Martí; mas, com Martí, há outros importantes antecedentes que acompanham ao chamado da intelectualidade cubana a uma frente antifascista internacional, e gostaria que você, a partir dessa rememoração histórica, nos ajudasse a compreender os antecedentes, mas também as bases desse chamado de nossos escritores e artistas.

Roberto Fernández Retamar – Cintio, de maneira magnífica, assinalou o papel fundamental das análises martianas dos Estados Unidos, análises em que ele sempre soube distinguir, com toda a clareza, entre o que chamou a pátria que amamos, de Lincoln, e a pátria que tememos, de Cutting: esta é uma linha de que ele nunca se afastou.

Antes ainda de Martí, há singulares previsões dos males que nos podiam advir dos então juvenis, mas já rapaces, Estados Unidos. Uma dessas previsões é do próprio Bolívar – e está citada no documento da UNEAC –, seis anos depois de emitida a Doutrina Monroe, o que, como se sabe, foi em 1823. Bolívar diz numa carta: "Os Estados Unidos parecem destinados pela Providência a infestar a América de misérias em nome da liberdade". E isso tem relação com o que Cintio dizia: com a hipocrisia, ou seja, utilizar termos como "democracia" e "liberdade" para mascarar seus verdadeiros propósitos.

Algum tempo depois, seria emitida a Doutrina do Destino Manifesto, e pode-se dizer que a Doutrina Monroe e a Doutrina do Destino Manifesto continuam sendo essenciais na política exterior dos Estados Unidos. A nossa América coube o triste privilégio de ser a cobaia inicial dessa política. Hoje em dia, essa política abarca todo o planeta e, por isso, chamamos à criação de uma frente mundial contra o neofascismo.

A propósito de Martí, antes de passar a outros exemplos, eu gostaria de recordar também suas imprescindíveis análises das primeiras Conferências Panamericanas: a que ocorreu entre 1889 e 1890, e a que ocorreu em 1891, ambas em Washington. Citarei apenas algumas linhas relativas a esse último congresso. Disse então Martí: "Crêem na necessidade, no direito bárbaro como único direito: ‘Isto será nosso, porque o necessitamos.’" Bem, não se pode dizer com menos palavras e com mais clareza o propósito, que continua vigente, mais de um século depois.

O imperialismo continuou desenvolvendo-se – Martí o viu surgir, é possível que suas análises tenham sido as primeiras análises concretas sobre o imperialismo – por todo o mundo e levou, sem dúvida, a uma crescente atitude antiimperialista.

Em 1927, celebrou-se em Bruxelas um memorável congresso antiimperialista, no qual esteve presente Julio Antonio Mella, cujo centenário natalício estamos comemorando. Mella leu ali comunicações redigidas por seu fraternal Rubén Martínez Villena. Esse foi um congresso verdadeiramente importante, ao qual enviaram saudações personalidades como Einstein, por exemplo, e havia uma série de grandes lutadores, depois chamados a ter um papel muito importante na história.

Entretanto queremos insistir em antecedentes ainda mais específicos de nossa posição, de nossa declaração. Teríamos de pensar no momento que o fascismo declarado se converte numa força invasora do planeta. Sabemos que o fascismo se estabelece pela primeira vez, em 1922, na Itália, sob Mussolini, e em 1933, numa forma ainda mais agressiva, mais bárbara, na Alemanha hitlerista, a Alemanha nazista, e é esta presença do fascismo, que se estendia sobre o planeta como uma sombra, que leva a que um grupo de intelectuais realize em Paris, em 1935, o Primeiro Congresso de Intelectuais Antifascistas, o Primeiro Congresso em Defesa da Cultura. Esse congresso celebrado em Paris, em 1935, certamente será evocado em outras ocasiões nesta mesa. Ali houve intervenções muito importantes, como as de Bertolt Brecht.

Dois anos depois, o fascismo cresceu ainda mais, pôs sua garra sobre a Espanha republicana e iniciou a guerra em 1936, a infausta Guerra Civil Espanhola; e então, em 1937, celebrou-se um Segundo Congresso de Intelectuais Antifascistas, um Segundo Congresso em Defesa da Cultura, que se realizou principalmente em Valencia, tendo, inclusive, uma continuidade em Paris. Esse congresso foi capital. García Márquez classificou-o de um dos poucos congressos dessa natureza verdadeiramente transcendentes na história. Cuba teve o privilégio de estar representada nesse congresso por figuras iminentes, como Alejandro Carpentier, Nicolás Guillén, Juan Marinello, Félix Pita Rodríguez, Leonardo Fernández Sánchez. Foi um congresso que reuniu uma grande quantidade de intelectuais de primeira linha do mundo inteiro, e esse congresso foi celebrado sob as bombas; esse congresso ocorreu em meio ao combate pela liberdade que estava travando, desgraçadamente sem êxito, o magnífico povo espanhol. Para citar antecedentes de nossa posição, é preciso destacar muito esse congresso, e não fomos os únicos a destacar um antecedente dessa natureza.

Desgraçadamente, o mundo voltou a ver renascer o fascismo, que tinha sido derrotado militarmente em 1945: estamos diante de uma nova expansão do neofascismo, e é muito bonito – Carlos já o mencionou, e certamente será mencionado novamente – que um grupo notabilíssimo e numeroso de destacados intelectuais estadunidenses tenha retomado a bandeira de rechaçar essas violências, e refiro-me concretamente ao manifesto já mencionado "Não em nosso nome", um manifesto subscrito por muitos dos mais brilhantes intelectuais estadunidenses.

Penso em figuras como Edward Said, a quem, daqui a 48 horas, vão homenagear, pelos 25 anos da publicação de seu grande livro Orientalismo; penso em Noam Chomsky; penso em muitíssimos artistas de cinema, muito corajosos, que certamente também serão mencionados novamente na mesa.

Esse manifesto quase não tem par na história dos Estados Unidos. Recorda-me o "Manifesto dos 121", dos franceses, no princípio da década de 60, quando apoiaram a guerra de libertação da Argélia; mas este de agora é numerosíssimo. O dado que tenho é de que há mais de 20.000 pessoas que já o assinaram: um documento que em princípio não tinha maneira de ser publicado, porque a imprensa não queria acolhê-lo naquele país, e no final tiveram de comprar uma página de um jornal, para que a declaração aparecesse, e que depois reapareceu em muitas ocasiões e teve uma repercussão muito grande.

Por exemplo, na Europa, algum tempo depois, publicou-se um manifesto com o nome "Contra a barbárie", e esse manifesto diz explicitamente: "Fazemos nosso o chamamento Não em nosso nome, dos intelectuais e artistas estadunidenses que se negam a permitir que seu governo leve a cabo, em seu nome, seus planos de espólio e extermínio", etc. Ou seja, teve uma repercussão européia.

E mais recentemente – ainda não foi publicado por nossas publicações, por nossas revistas, como deverá ser – divulgou-se, no princípio deste mês, um manifesto do chamado Comitê Internacional de Intelectuais contra a Guerra, no mesmo espírito, solidarizando-se com os intelectuais estadunidenses, e esse novo manifesto está assinado, sobretudo, por intelectuais latino-americanos.

Menciono esses precedentes porque não estamos em presença de uma atitude solitária de nossa parte, ao contrário, estamos muito conscientes de que fazemos parte de um coro, de uma frente que se opõe vivamente ao neofascismo e que está recebendo uma grande acolhida dos povos do mundo todo.

Milhões de homens e mulheres desfilaram, em toda parte, contra a guerra e a favor da paz, milhares de intelectuais estão assinando documentos, realizando obras de arte, participando de atividades muito variadas com esses fins.

Nosso gesto é um gesto – repito – que se soma a muitíssimos outros, e estamos certos de que, apesar de não existir um cerco militar contra o neofascismo, o cerco dos povos, o cerco da opinião pública, o cerco dos intelectuais será suficiente para impedir que o neofascismo triunfe sobre o planeta e assim ponha em risco de extinção a espécie humana.

Randy Alonso – Obrigado, Retamar, por suas reflexões.

(Passam imagens do tema)

Randy Alonso – Se a filosofia de Hegel, Nietzsche, Schopenhauer deram vida e paixão aos criadores do holocausto do século XX, espécimes menos cultos e de menor prosápia intelectual, mas mais pragmáticos, alentam a quadrilha fascista do século XXI.

Autores de cabeceira da atual administração norte-americana são o bostoniano Henry Cabot Lodge, que afirmou que "No século XIX nenhum povo igualou nossas conquistas, nossa colonização e nossa expansão, e agora nada nos deterá"; também Marse Henry Watterson, que declarou que os Estados Unidos "são uma grande república imperial, destinada a exercer uma determinante influência na humanidade, e a modelar o futuro do mundo, como nenhuma nação antes, nem mesmo o Império Romano"; ou Charles Krauthemer, que há pouco escreveu no Washington Post: "Os Estados Unidos cavalgam pelo mundo como um colosso. Desde que Roma destruiu Cartago, nenhuma outra potência alcançou as alturas a que chegamos. Os Estados Unidos ganharam a guerra fria, puseram a Polônia e a República Tcheca no bolso e depois pulverizaram a Sérvia e o Afeganistão. E de passagem demonstrou a inexistência da Europa".

E há também Zignew Brzezinski, que declarou que "o objetivo dos Estados Unidos deve ser o de manter a nossos vassalos num estado de dependência, garantir a docilidade e a proteção de nossos súditos e prevenir a unificação dos bárbaros".

É a doutrina que sustenta à administração norte-americana de hoje, a que se coloca – como dizia Retamar – um novo "destino manifesto": implantar uma ditadura fascista mundial; um neofascismo e uma ditadura que está alentada e que tem, dirigido às grandes massas, um vasto poder de mídia, que utilizaram durante toda essa administração e que teve, sem dúvida, um papel fundamental nessa guerra desatada contra o Iraque, em que os meios de comunicação foram outra arma de batalha sofisticada e tecnológica com que os Estados Unidos contaram.

Sobre o papel desempenhado por esse poder da mídia na implantação do neofascismo norte-americano, peço a Elíades Acosta suas reflexões nesta mesa-redonda.

Elíades Acosta – Bem, Randy, é muito interessante escutar, por exemplo, o nome de Henry Cabot Lodge, a que você se refere. Foi um dos grandes amigos de Theodore Roosevelt e dos promotores da invasão norte-americana e da expansão no ano de 1898, começando assim o que se deu por chamar "O Século Americano", que tem, exatamente nestes dias, com a guerra do Iraque, sua entrada numa fase qualitativamente diferente.

Na Declaração da UNEAC colocava-se, com toda a razão, que à guerra preventiva e à guerra relâmpago, acrescenta-se, por parte dos Estados Unidos, um poderoso sistema de propaganda e desinformação.

Eu tenho também em minhas mãos um livro que vale a pena recordar, e este rosto (mostra o livro com a imagem de Hitler), porque suponho que também pode ser um dos livros de cabeceira desses senhores: o livro Minha luta, de Adolf Hitler. Creio que também vale a pena voltar a falar sobre essa ideologia, porque é a que estamos vendo no mundo atualmente.

O fascismo foi sumamente hábil na hora de usar para seus fins todas as ferramentas de propaganda, que eram primitivas, se comparadas com as que existem atualmente para desinformar.

Vou citar três exemplos daqueles momentos, daquele fascismo de Hitler: por exemplo, o uso de conceitos como nacional-socialismo, para definir seu partido, sendo precisamente um partido da burguesia, que o que pretendia era brecar o avanço do socialismo e do comunismo na Europa e no mundo; o uso do negro e do vermelho entre seus emblemas, que eram cores usualmente empregadas como símbolos na luta dos trabalhadores, e as palavras "companheiro" e "camarada" para o tratamento dos fascistas entre si.

Isso demonstra a astúcia, a frieza desses ideólogos, a que se referia Cintio. O trabalho de Goebbels é conhecido, e sabe-se tudo que recomendou sobre o uso da mentira para dominar as massas.

A máquina de propaganda que estamos vendo atuar retoma aquelas experiências e as leva a extremos insuspeitados. Estamos vendo não apenas escamotear-se a verdade, senão tratar de que o espectador normal, o homem que recebe as mensagens da mídia se mantenha passivo e, portanto, converta-se num cúmplice da barbárie e do crime.

Há pouco Retamar mencionava o caso do Congresso de Paris de 1935, do Primeiro Congresso em Defesa da Cultura, e gostaria de mencionar algumas palavras de Bertolt Brecht, o grande dramaturgo alemão, que foram pronunciadas então ali, quando se via o fascismo avançar na Europa, e Brecht alertava sobre um mecanismo de dominação das massas, um mecanismo psicológico que foi usado então e é usado neste momento.

Cito a Bertolt Brecht: "Um homem é golpeado, e o espectador da cena desmaia, Claro que é natural. Quando chega o crime como a chuva que cai, já ninguém grita: ‘Pare!’ Não existe meio de impedir o homem de virar a cara diante da abominação? Por que vira a cara? Vira a cara porque não vê nenhuma possibilidade de intervir; o homem não se detém na dor de outro, se não pode ajudá-lo".

Esse mecanismo é precisamente um dos mecanismos de dominação e de desinformação que mencionamos.

Mas as manifestações contra a guerra a que se referia Retamar demonstram que esse mecanismo de dominação não é infalível, e que muitas pessoas sentem que têm capacidade para influir sobre a marcha da política universal.

No caso da Venezuela, por exemplo, bem conhecido do público cubano, e agora no caso do Iraque, ocorreu algo muito interessante, quanto aos métodos de dominação e à mentira, tão utilizados pelo fascismo, e é que os mecanismos de dominação se transparentizaram. Ou seja, as pessoas puderam ver e experimentar por si mesmas como se produz esse colossal engano e como se trata de transtornar a verdade, para conseguir passividade e cumplicidade.

Já se torna difícil enganar da mesma forma, e creio que essa é uma das possíveis vantagens colaterais trazidas por um conflito tão desastroso como esse do Iraque.

Eu gostaria também de referir-me brevemente – e a doutora Graziella Pogolotti mencionou-o muito acertadamente nesse extraordinário pleno do Conselho Nacional da UNEAC – ao que está subjacente à guerra e a esse surto do fascismo, e tenho em mãos um documento de 3 de junho de 1997, que se chama "Programa para um Novo Século Americano". É um programa – repito – do ano de 1997, redigido por um grupo de falcões, um grupo do que seria o "partido da guerra", que levou seu país à guerra do Iraque e que está por trás das próximas agressões que serão realizadas. Entre eles, estão Elliott Abrahms, William Bennet, Jeb Bush, Dick Cheeney, Francis Fukuyama, o de O fim da história; Dan Quayle, Donald Rumsfeld e Paul Wolfowitz.

Esse documento é a plataforma ideológica do que estamos vendo, e essa guerra é seu braço armado; mas o pensamento, a reflexão que sustenta o que ocorreu, parte de dizer que a doutrina de segurança nacional dos Estados Unidos está numa etapa de decadência – eram os tempos da administração Clinton – e que é necessário tomar vigorosas medidas para garantir o futuro século americano, ou seja, o que vivemos agora. É muito interessante, porque, por várias vezes, fala-se, no documento, em guerra preventiva.

Todos recordamos as películas do Oeste, e que no Oeste só subsistia aquele que sacava primeiro o revólver e disparava; somente os mais rápidos e os mais fortes. Estamos, então, uma vez mais, na época da "Lei do Revólver", só que em escala universal e com mísseis Tomahawk.

Tenho aqui também – pois tem a ver com este tema – uma declaração de um oficial do FBI, de setembro de 2002, tratando de explicar a um grupo de bibliotecários norte-americanos por que o FBI tinha direito a ter acesso aos dados das solicitações de leituras feitas por seus usuários. Foi uma tentativa infrutífera, não conseguiu nada: os bibliotecários não se deixaram convencer, nem sequer pôde terminar sua discussão; mas o interessante é o argumento que maneja esse oficial, demonstrativo da vigência da "Lei do Revólver".

Diz textualmente: "No passado, quando púnhamos a alguém na cadeia, era depois de haver cometido um crime. No presente, pomos uma pessoa na cadeia para prevenir que possa cometer um ataque terrorista". Quer dizer que qualquer pessoa (ou país), ainda que não tenha cometido nenhum delito, pode ser submetido a um castigo.

Nessa plataforma do projeto "Por um Novo Século Americano", há conceitos que são realmente muito ilustrativos do que estamos explicando.

Por exemplo, repetem-se várias vezes conceitos arrepiantes: defesa preventiva, liderança global, aproveitar desafios e oportunidades, estamos indefesos diante das ameaças globais, é preciso promover os princípios americanos; é preciso ter prudência na forma como se exerce o poder, mas não devemos deixar de exercê-lo por temor ao que nos pode custar; é vital para os Estados Unidos manter um papel ativo na defesa da paz no mundo. Para eles, o mundo se reduz a Ásia, Europa e Oriente Médio; nem África, nem América Latina são mencionados expressamente no documento.

"É preciso golpear antes que surjam as crises, é preciso fortalecer os nexos com os aliados democráticos" – já sabemos quem são os aliados democráticos tradicionais dos Estados Unidos – "é preciso desafiar os regimes hostis aos interesses e valores dos Estados Unidos" – quer dizer, o que fizeram com o governo iraquiano entra nesta estratégia –, "é preciso promover a causa da liberdade política e econômica" – o neoliberalismo e a globalização –, "é preciso expandir uma ordem favorável à segurança, prosperidade e princípios dos Estados Unidos", etc., e terminam com uma citação que é tão eloqüente, que não resisto a lê-la, e diz: "Essa política reaganista" – muitos deles foram funcionários de Reagan e de Bush pai –, "de fortalecimento militar e clareza moral" – ou seja, de expressar despudoradamente o que querem e a que vão –, "pode não estar na moda hoje, mas é necessária para que os Estados Unidos mantenham os êxitos do século passado e ampliem nossa segurança e grandeza no próximo".

Um país democrático nunca fala de grandeza; quem fala de grandeza são os impérios.

Preocupa o que ocorreu em Bagdá, a destruição, o saqueio, frutos da guerra... Vimos cenas dantescas, que cobriram de dor a todo homem sensível e, sobretudo, aos intelectuais e artistas do mundo todo; foram saqueados 174.000 objetos patrimoniais, a história de mais de 7.000 anos de Iraque: o Museu Nacional, o Museu Arqueológico, o Teatro de Bagdá... Hoje se fala – chegam notícias muito tristes – do saqueio e provável incêndio da Biblioteca Nacional do Iraque, tudo isso com uma estranha cumplicidade do ocupante militar, com uma estranha passividade.

Os Estados Unidos são peritos em controle de multidões, são peritos em toques de recolher, são peritos em lei marcial; entretanto não puderam aplicar nada disso em Bagdá, e estamos vendo aí – em minha opinião pessoal – uma tentativa de transformar em vilão um povo que lhes ofereceu uma resistência inesperada. Estão tratando, com esses métodos de desqualificação na imprensa, que são métodos fascistas, de demonstrar que esse povo é um povo propenso ao roubo, ao saque, à destruição, sem nenhuma cultura.

Há antecedentes disso, muitos antecedentes. Por exemplo, na primeira ocupação militar norte-americana em Santiago de Cuba, no ano de 1898, saquearam, destruíram, roubaram, trouxeram especialistas da Biblioteca do Congresso para carregar os livros que saqueavam, levaram relíquias religiosas, levaram obras de arte, trocaram por alimentos valores patrimoniais da população faminta, levaram lembranças. Como fizeram agora com a estátua de Sadam, por exemplo, lá em Santiago de Cuba fizeram com a Árvore da Paz, foi preciso colocar alguns vigias, para evitar que continuassem destruindo-a.

Estamos, portanto, diante de uma profunda filosofia do despojo e da mentira, e creio que isso é realmente uma amostra de que estamos entrando em épocas terríveis, e que todo homem e mulher sensíveis do planeta devem estar alerta, como estiveram os povos a partir do Congresso de Paris em 1935, ou do de Valencia em 1937, diante da barbárie, que não é outra coisa senão essa filosofia do imperialismo norte-americano e seus aliados.

Randy Alonso – Uma filosofia, Elíades, que, inclusive, hoje mesmo eu estava lendo no jornal The New York Times, um artigo de opinião de William Saffire, um dos colunistas mais importantes do The New York Times, representante dessa ultradireita norte-americana, intitulado "A melhor defesa", e é a defesa, até as últimas conseqüências, por esse homem, do que se denomina política preventiva.

Faz referência ao famoso campeão norte-americano dos pesos pesados, Jack Dempsey, que dizia que a melhor defesa é uma boa ofensiva, e diz William Saffire: "Essa é a essência de nossa política de prevenção, os Estados Unidos não esperarão para ganhar a simpatia do mundo como vítima, senão que se defenderá a si mesmo, atacando primeiro", é um artigo realmente em defesa do sustentado por essa administração neofascista: converter o ataque preventivo em sua doutrina de política exterior para o mundo, e essa é – segundo eles – a melhor defesa do povo norte-americano. É a mesma política de que falava Hitler, na época em que governou a Alemanha, e em que também proclamava a necessidade do ataque preventivo, para defender o povo alemão e impor sua superioridade.

Não há dúvida de que são os nexos dessa administração norte-americana não apenas com esse pensamento de ultradireita, que já vem desde antes, senão também com o pensamento propugnado pelo fascismo hitlerista.

Obrigado, Elíades, por seus comentários.

(Passam imagens sobre o tema)

Randy Alonso – Essa pretendida hegemonia norte-americana, impulsionada pela direção neofascista que governa hoje os Estados Unidos, tem uma expressão concreta na pretendida hegemonia cultural que, desde os Estados Unidos, se deseja impor ao restante do mundo. Uma hegemonia que, como dizia Elíades, tem uma base nesse poder midiático que os Estados Unidos têm hoje, e que acompanha seu poder tecnológico e seu poder militar; mas que tem, é claro, um componente muito mais amplo em todo o aspecto cultural que essa administração tenta impor ao mundo e que, sem dúvida, faz parte dos objetivos desse neofascismo norte-americano.

Eu gostaria que Julio García Espinosa, que acompanhou de perto, durante muito anos, todos esses aspectos da globalização cultural, da hegemonia cultural norte-americana, especialmente dentro do cinema, fizesse sua avaliação. À luz dos acontecimentos atuais, como vê essa pretendida hegemonia cultural norte-americana e os atores que, desde a própria intelectualidade, saíram em defesa da genuína cultura desse povo e dos povos do mundo.

Julio García Espinosa – Antes de tudo, gostaria de dizer que, para um cineasta latino-americano é evidente, muito evidente, que um país sem imagens é um país que não existe, como é evidente que o não à guerra significou o não ao fascismo, como é evidente que os mesmos que atacaram com uma guerra ilegal, desnecessária, injusta ao povo do Iraque, são os mesmos que impediram e impedem que sejamos protagonistas de nossa própria imagem.

Creio que, ainda mais evidente que isso, é o fato de que não apenas impedem que sejamos os protagonistas de nossa própria imagem, senão que se arrogam o direito de realizarem eles a nossa imagem, e, sem dúvida, nós somos o alvo preferido, pelos menos foi o que demonstraram durante esses mais de 40 anos, já que nos escolheram para dar sua versão da realidade cubana.

Evidentemente, têm sua razão, visto que nós somos os verdadeiros dissidentes da política que seguiram e seguem em nosso continente, e é muito evidente que essa política, nós, os cineastas da América latina, tratamos de combater, mas em condições verdadeiramente desiguais. Assim como há um intercâmbio desigual na esfera da economia, há também na esfera da mídia.

Há um exemplo muito concreto, que é como se manipulou o sucedido em nosso país nos últimos tempos. Ou seja, a reunião que ocorreu entre os supostos dissidentes, poderíamos dizer que dissidentes como produto de marketing; dissidentes que se reuniram com o representante diplomático do vizinho do Norte e, praticamente, isso foi divulgado como a reunião de alguns dissidentes com esse senhor, como se fosse para tomar chá.

Parece-me que era óbvio, e é óbvio, que a relação que tivemos com esse país durante tantos anos, em que houve todo tipo de agressões, todo tipo de terrorismo de Estado, desde explosão de aviões em pleno vôo; desde tentativas de assassinato a Fidel, declarado pública e oficialmente, até financiamento de invasão a nosso país, tudo isso que foi tão evidente; não é possível que, de um momento a outro, tenham convertido a nós, que fomos vítimas, em agressor.

É indiscutível que "não é possível confundir durante todo o tempo" – era uma frase de Lincoln – "a todo o povo"; mas eles têm esse grande poder da mídia, têm esse grande poder para distorcer nossa própria imagem, tirar-nos o direito de que sejamos nós que a realizemos; e assim, em meio a uma situação em que hoje se agudiza mais toda essa agressividade, quando dizemos não ao fascismo, nós, cineastas latino-americanos, não o vemos como um qualificativo, mas como a situação colocada por esse novo governo, que o fascismo se define a partir de fatos concretos: fatos como o de que violaram e passaram por cima de um organismo internacional que se supõe que regule as relações internacionais, como é a ONU; fatos como o de que se arrogam o direito de pôr e tirar governos no mundo; fatos insólitos como o de anunciar que podem fazer guerras preventivas. Todos esses são sintomas indiscutíveis que definem o caráter fascista de um governo, e são fatos que encerram, ademais, um grande perigo para nós. Encerram um grande perigo porque conseguem tergiversar nossa realidade e preparar o caminho, nessas circunstâncias, para uma agressão.

Parece-nos que os cineastas da América Latina já têm muita experiência na luta contra o fascismo.

É indiscutível que os que puseram as ditaduras na América Latina foram esses mesmo governos, esse mesmo tipo de política em relação à América Latina. Iniciaram a ditadura, puseram as ditaduras em toda a América Latina. Os cineastas da América Latina combateram essas ditaduras, combateram-nas para ver se a América Latina podia ter uma verdadeira democracia, não a democracia caricaturesca que normalmente imperou nesses territórios, e eles deram sua vida, os cineastas latino-americanos foram vítimas de torturas, foram assassinados, foram desaparecidos, nenhum foi se exilar em Miami; ou seja, os cineastas latino-americanos têm um longo histórico de luta contra o fascismo.

Poderia dizer algo parecido, embora não queira estender-me muito, em relação aos próprios cineastas norte-americanos. Os cineastas norte-americanos também têm um extenso histórico em sua luta contra o fascismo. Vale a pena mencionar, digamos, apenas a etapa do macarthismo.

Como vocês se lembram, essa foi uma etapa verdadeiramente sinistra, em que não poucos cineastas foram sacrificados, e essa é uma memória que se mantém viva e que surgiu agora, recentemente, com as reações dos artistas, inclusive de Hollywood, com uma firmeza muito conseqüente com sua própria história, de enfrentar as novas posições que aparecem, nos próprios Estados Unidos, quanto a uma política fascista. Aí estão os casos, por exemplo, de Susan Sarandon, de Danny Glover, etc., que já tiveram a prova e já se tornou óbvio que há determinadas manifestações para impedir as pessoas de irem ver as películas desses cineastas.

Ou seja, para os cineastas em geral, e para os cineastas da América Latina, em particular, sabemos que o inimigo é poderoso; mas sabemos também que nossa dignidade é poderosa, como sabemos que quanto maior seja o inimigo, maior será nossa dignidade.

Randy Alonso – Um inimigo também que, sobre todas as coisas, em seu afã dominador, pretende impor de forma hegemônica sua cultura, a partir da perspectiva da incultura desse governo, a partir da perspectiva da barbárie que pretende implantar esse governo, que advoga por uma tirania fascista mundial e uma pretendida hegemonia cultural, que é simplesmente implantar a hegemonia da incultura; é realmente o que pretende esse governo norte-americano, e, por isso, às vezes, em meio à dor que causa e ao furor com que a pessoa pode ver essas imagens, alguém pode entender que ocorram coisas como essas que Elíades nos contava, do incêndio da Biblioteca Nacional de Bagdá, da perda de valiosos documentos no Centro de Estudos Islâmicos, do atroz saqueio do Museu Nacional de Bagdá, diante da mirada complacente das forças de ocupação, como havia sido desde a época daqueles que acompanharam a Roosevelt na entrada a Santiago de Cuba, ou dos que, na Operação Panamá – como se recordava no Conselho Nacional da UNEAC –, sob o comando do pai do atual Presidente norte-americano, saquearam também o patrimônio cultural do Panamá, sem que até hoje uma única daquelas peças tenha voltado a seu possuidor original.

São os mesmos que hoje permitem esse tipo de saqueio, e são os que destruíram o patrimônio de uma nação que é berço da civilização ocidental, apesar de, desde antes da guerra, numerosos intelectuais, numerosas pessoas de pensamento em todo o mundo terem clamado por que fossem respeitados esses sítios históricos.

Eu gostaria de recordar, em nossa mesa, um trabalho feito pela jornalista Esther Barroso, após desatar-se a guerra, falando desses sítios sagrados para a cultura universal.

Esther Barroso – O nonagenário escritor argentino Ernesto Sábato, prêmio Cervantes de Literatura, chorou frente a milhares de crianças pedindo que não se destrua um país, uma história.

Como muitos outros no mundo, sabe que este será um crime de lesa-humanidade; mas também sabe que o Iraque não é, como pensam Bush e seus aliados, um obscuro rincão do mundo, senão a maior parte do que foi a antiga Mesopotâmia, berço da civilização humana.

Além das vítimas inocentes, o que pode morrer no Iraque, com essa guerra? Nada menos que um dos vestígios artísticos e arquitetônicos mais antigos da humanidade, datados de 9000 anos antes de nossa era.

No Iraque podem morrer, por exemplo, as marcas da civilização suméria, que inventou os primeiros signos da escrita cuneiforme, considerada a grande contribuição da Mesopotâmia para a humanidade. Desenvolveram também um sistema próprio de irrigação, pela primeira vez na história, inventaram a semeadura em sulcos, um sistema de esgotos e a arquitetura como arte.

Assim devia ser, 4000 anos antes de nossa era, a cidade suméria de Ur. Desse esplendor, restam hoje marcas, agora em perigo de serem extintas.

Bush também poderá destruir os vestígios do império assírio, a 500 quilômetros de Bagdá, que, entre outros valores, criou uma grande biblioteca, cujas tábuas de escrita cuneiforme permitiram entender em muito as origens da civilização.

Saberá Bush que, neste sítio, a apenas 90 quilômetros de Bagdá, floresceu a cidade da Babilônia? É possível que o genocida do século XXI nunca tenha ouvido falar dos jardins suspensos que o rei Nabucodonosor mandou construir no ano 600 a.C., e que depois foram considerados como uma das sete maravilhas do mundo, ou da mítica Torre de Babel, que se supõe tenha sido levantada às margens do rio Eufrates.

Será esta uma guerra contra as histórias das Mil e uma noites, possivelmente nascidas em Bagdá, cidade edificada no ano 762 d.C.? Muitos dos valores criados pelas sucessivas civilizações da Mesopotâmia, como a Porta de Istar, estão hoje fora do Iraque, espalhadas por museus do mundo; mas muitas outras se conservam no Museu Iraquiano de Bagdá. Será destruído pelos mísseis dessa impiedosa guerra?

Segundo Bush, o uso da força é apenas da desarmar o regime iraquiano, mas quem pode explicá-lo ao escritor Ernesto Sábato, de 92 anos, que chora pelo Iraque? Quem pode fazê-lo entender que as águas dos rios Tigre e Eufrates, que viram nascer e crescer a civilização, serão agora testemunhas da barbárie que chega do mundo moderno?

No sepulcro da princesa assíria Java, descoberto no ano de 1989, próximo de Bagdá, uma inscrição sentencia: "Malditos para sempre aqueles que profanem a tumba e roubem o tesouro!" Hoje a princesa parece dizer-nos, com sua voz milenar: "Malditos para sempre os que destroem a vida e o tesouro da humanidade!".

Randy Alonso – Um tesouro da humanidade consumido pelas chamas, saqueado em presença das tropas imperiais, das tropas invasoras.

Um cabo da agência de notícias EFE, hoje, de Bagdá, diz que "os iraquianos acodem, cada vez em maior número, a protestar diante do hotel Palestina, de Bagdá, onde os Estados Unidos criaram um embrião de administração civil para o Iraque, um dia depois de os saqueadores incendiarem a Biblioteca Nacional e o Centro de Estudos Islâmicos.

"Mais de 300 pessoas com cartazes protestavam nesta manhã, diante dos soldados dos Estados Unidos que protegem o hotel com alambrados, armas e tanques, para exigir segurança numa cidade sem lei de uns seis milhões de habitantes.

"Os ânimos estão cada vez mais exaltados, e o que começou com débeis petições converteu-se agora em iradas discussões com as tropas ocupantes e, em muitos casos, com slogans antiamericanos.

"O último episódio de saque ocorreu no Centro de Estudos Islâmicos, com 15.000 volumes, situado na parte traseira do Ministério de Assuntos Islâmicos, que foi assaltado e incendiado na manhã de hoje.

"A Biblioteca nacional do Iraque também foi objeto, à noite, da barbárie, e a maioria do milhão de documentos, livros, mapas, microfilmes e arquivos foram roubados ou destroçados.

O diretor dessa biblioteca afirma que "se perderam exemplares antigos do Corão e do primeiro periódico editado no Iraque, em 1869, em língua persa. Desde a invasão dos mongóis, não tínhamos visto nada semelhante, perderam-se 700 anos de história", afirmou.

Algo similar ocorreu no Museu Nacional de Bagdá. As agências de notícias, no sábado passado, informavam que "o Museu Nacional do Iraque, com inestimáveis coleções das culturas suméria, acadiana, babilônica e assíria, além de textos islâmicos únicos, foi completamente saqueado no sábado, por uma turba de saqueadores que se aproveita do caos que impera na capital iraquiana, desde a quinta-feira, quando entraram as forças anglo-estadunidenses.

"Os vândalos levaram tesouros insubstituíveis das primeiras civilizações, recipientes de ouro, máscaras rituais, toucados reais, liras incrustadas de jóias e artefatos da antiga Mesopotâmia. ‘Foram saqueados 7.000 anos de civilização’, lamentou-se um empregado do museu".

Uma destacada artista cubana, a pintora Lesbia Van Dumois, vice-presidenta da Casa das Américas, foi um dos cubanos que teve o privilégio de visitar o Museu Nacional de Bagdá, de ver a riqueza que entesourava esse Patrimônio da Humanidade que foi saqueado diante dos olhos das forças invasoras, e ela também quis dar seu testemunho para nossa mesa-redonda de hoje.

Lesbia Van Dumois – Creio que foi, realmente, um privilégio, pensando no que sucedeu agora com esse museu, haver tido a oportunidade, no final da década de 80, por ocasião de um encontro da Associação Internacional de Artes Plásticas, patrocinada pela UNESCO, de ir a essa cidade, uma cidade realmente linda, e, entre as muitas atividades que ocorreram ali, ter visitado o museu, onde estavam todos os valores não somente dessa cidade original, que é a origem de nossa cultura ocidental, mas de ter visto ali as peças, ter a oportunidade de ver as tábuas cerâmicas do alfabeto cuneiforme, ter visto as cabeças, todas as coleções de ouro que havia naquele museu, onde estavam, realmente, muito bem postas.

Eu não sei se esse museu tinha... Como edifício era muito antigo; mas parece-me que tinha sido renovado um ou dois anos antes de nossa visita.

Creio que, além desses valores, pensar em Bagdá é como enfrentar outro mundo; uma cidade que, além disso, tinha uma arquitetura muito bonita. O museu não era um museu gigantesco, não impressionava tanto pela arquitetura, mas pelos valores interiores que tinha, com uma museografia que permitia entender a história que estavam contando ali, e estavam essas maravilhosas cabeças, uma quantidade de peças de ouro realmente impressionantes.

Bem, embora não seja especificamente desse museu – que agora soubemos que foi muito saqueado –, não gostaria de terminar sem dizer também que tive a oportunidade de ver Babilônia, uma cidade que nos deixou deprimidos ao vê-la, porque já não era a Babilônia que queríamos encontrar; mas tive a oportunidade de ver aquele maravilhoso friso cheio de grifos e de ver, pelo menos, uma das figuras, um leão, das esculturas que existiam naquele território, que era realmente a soma de uma cultura e de uma expressão artística invejável; esperamos que algumas das peças possam ser salvas, para que sirvam de patrimônio dessa humanidade que estamos destruindo.

Jornalista – Lesbia, ao longo da história, Bagdá e o território iraquiano já tinha sido saqueado de seus valores, que já estavam em outros museus do mundo; mas, apesar disso, gostaria que você comparasse o valor desse museu, do que entesourava esse museu, em relação a outros, como o britânico ou outros do mundo.

Lesbia Van Dumois – Bem, eu creio que a maioria dos museus de outros países ocidentais se alimentou saqueando os tesouros que não lhe correspondiam. Se pensarmos no México, muitas de suas coisas de seu pré-hispânico estão na Europa, em Pergamon, quase todos os tesouros estão em outras cidades. Mas hoje, falando com a diretora de nosso Museu Nacional, que tem uma longa experiência com referência ao que corresponde ao patrimônio, os museus não são o que você vê sendo mostrado nas salas em determinado momento. Eu não tive oportunidade de ver seus fundos, mas, com o que ali se mostrava, imagino que os tesouros que podia ter em seus fundos, o que seria seu patrimônio, eu diria que não posso avaliar. É inestimável a que corresponderia, tanto em valor monetário, como em valor eminentemente cultural, a possibilidade de desfrutá-lo, vê-lo, de que as peças de arte correspondam a um país e que estejam nesse país é algo que não se pode avaliar.

Randy Alonso – Robert Fisk, um dos jornalistas que mais profundamente conhece a zona do Oriente Médio, que, com sua pena, também defendeu o patrimônio cultural dos países árabes, perguntava-se num artigo, há alguns dias: "Por quê? Como puderam fazer isso? Por que, quando a cidade já estava em chamas, e a anarquia tinha se espalhado, e menos de três meses depois que arqueólogos estadunidenses e funcionários do Pentágono se reunissem para falar dos tesouros do país, e que se colocou o Museu Arqueológico de Bagdá numa base militar de dados, os estadunidenses permitiram que a turba destruísse a inestimável herança da antiga Mesopotâmia? E isso tudo ocorreu enquanto o secretário de Defesa dos Estados Unidos, Donald Rumsfeld, mofava da imprensa, por dizer que ‘a anarquia havia se apoderado de Bagdá’".

Robert Fisk também se perguntava, hoje, como era possível que 2.000 soldados estivessem custodiando os poços de petróleo de Kirkuk, e não houvesse sequer 200 soldados norte-americanos que pudessem custodiar a grande riqueza patrimonial de Mosul.

Robert Fisk também se perguntava, hoje, por que as tropas norte-americanas rodeiam o Ministério do Interior e o Ministério da Energia do Iraque, enquanto no restante da cidade se saqueia indiscriminadamente o patrimônio cultural daquela nação.

É também uma expressão concreta da barbárie do invasor, da incultura dessa administração norte-americana que pretende estabelecer essa ditadura fascista mundial; uma administração que chegou ao poder pela fraude e que, através da força, tentou legitimar-se; uma administração que está bastante longe dos verdadeiros ideais do povo norte-americano, um povo idealista, de nobres sentimentos, e ao qual Pablo Armando Fernández conheceu profundamente, podendo também intercambiar com a riqueza cultural do verdadeiro povo norte-americano.

Diante dessa camarilha fascista, Pablo Armando Fernández, como você avalia a cultura, as idéias e o papel do povo norte-americano?

Pablo A. Fernández – Bem, eu cheguei aos Estados Unidos em 1945, havia uma guerra contra o fascismo. Quantos anos passaram? Meio século, digamos. Cinco anos depois, já não era o mesmo país, McCarthy já tratava de mudá-lo, sujá-lo, enfeá-lo, provocou muitos danos.

Apesar disso, esse povo de que falamos agorinha, de que falamos todo o tempo, esses que dizem Não em nosso nome, continua sendo um grande povo.

Mas eu me preocupo com a nação norte-americana. Pensemos que os Estados Unidos da América do Norte fizeram a primeira revolução neste continente contra o colonialismo; tomemos em consideração esses escravos que, depois de uma guerra civil entre os senhores capitalistas, digamos, de ambos os lados, mas por outros interesses fizeram uma guerra civil e libertaram esses escravos, deram-lhes uma voz e parte do rosto dos Estados Unidos. Pensemos nos judeus, islâmicos, cristãos, que chegavam perseguidos de seus países, desesperados, famintos, desiludidos, e como toda essa gente, os descendentes de todos esses povos quiseram dar um espírito a essa nação. Esse espírito transparecia através da poesia, da narrativa, do ensaio, do teatro, da música, do cinema, e nos foi dando um conceito realmente profundo, sério, do espírito, da alma que poderia ser do norte-americano. Esses seres estão ali, e esses seres são tão poderosos, que suas vozes estão continuamente exclamando que não em nome deles essa guerra que aterra ao mundo inteiro; porque estamos vendo como, de repente, saqueiam-se os fundos culturais, e eu tenho muito medo que se saqueie o fundo espiritual dessa nação.

Apesar disso, temos certeza de que todos esses senhores e senhoras, todos esses homens e mulheres que firmaram esses documentos estão em defesa desse espírito, e isso nos anima; mas ninguém pode descuidar-se, nem eles. Não podemos descuidar-nos, porque dizemos não, mas essas forças sinistras, sem alma, podem prejudicar o fundo desse espírito, que também é o nosso, porque esse espírito se universalizou de tal maneira, que influiu poderosamente na literatura, no cinema, no teatro, em todas as artes de toda a humanidade, e de repente você vê que Simone de Beauvoir diz maravilhas de Faulkner, e assim ocorreu entre os demais; na Inglaterra, na França, na Itália, há uma profunda admiração por esses seres que mostram o que é a sensibilidade, o que é o talento, o que é a imaginação de um povo que quer se definir como tal.

Esperemos todos que eles mantenham sua voz no alto, para que esse país mantenha sua cara e sua voz; mas é também nossa responsabilidade cuidar deles, preocuparmo-nos por eles, alimentar esses espíritos, dizendo-lhes: "Estão aí, lutem aí, mas nós, aqui, vamos lutar com vocês, vamos estar todos juntos, em toda parte, e eles não vão vencer".

Não vão vencer porque suas associações são muito escuras, e essa escuridão não produz nenhuma luz; vamos, portanto, assistir a essas vozes imprescindíveis para nosso ser, que são as vozes desses irmãos norte-americanos que fazem da arte e da cultura o espírito universal que nos assiste a todos.

Randy Alonso – E, sem dúvida, é dessa voz do povo norte-americano que nasce sua grande cultura, e que nasce também esse espírito, encontrado pelos artistas cubanos, cada vez que vão a esse país, e que encontram no povo uma acolhida como as que os norte-americanos recebem em Cuba, quando nos visitam, e que é parte da tradição cultural e da nobre tradição do povo norte-americano, como a recebida, em recente excursão por esse país, pelo Balé de Lizt Alfonso, que esteve em numerosas cidades norte-americanas, entre elas, Nova York; esteve em Cleveland, Seattle, em Austin, Texas, em New Haven, em Connecticut, e em outros lugares da geografia norte-americana, e recebeu elogiosas críticas do diário The New York Times, que falava do triunfo do grupo no sábado à noite, quando Lizt Alfonso se apresentou no Brooklyn Center da cidade de Nova York, ou do Chicago Sun Times, que dizia que "O balé de Lizt Alfonso é uma sensual mistura de fogo e tempero", e de outra importante publicação do país, que o qualificou de "Um vistoso flamenco à maneira cubana".

O que Lizt Alfonso encontrou em sua visita aos Estados Unidos? Lizt está conosco, aqui no público, e eu lhe pediria que nos falasse desse sentimento que ela encontrou nos Estados Unidos. E também como viveu a contradição de um país em guerra, e as manifestações feitas nas ruas. O que Liz Alfonso pode nos contar desse povo norte-americano que ela enfrentou do palco, mas com que confraternizou nesse itinerário por todo o território norte-americano?

Lizt Alfonso – Veja, eu encontrei que o espírito humano, o espírito de solidariedade, de amor, de confiança e de segurança, de que agora estava falando Pablo Armando. Eu gostei muito do que ele disse, penso que isso pode estar acima de tudo.

Realmente, a arte – como todos sabemos – rompe todas as barreiras, para os artistas não há impossíveis, e foi isso que aconteceu conosco em nossa excursão nos Estados Unidos.

Eu escrevi a minha mãe, de lá, e-mails, em que lhe dizia: "Ainda não houve público que nos resista. Quando dançamos a Malaguenha (é o primeiro número do espetáculo) e finaliza, o teatro vem abaixo. É o termômetro de cada apresentação. Você imagina o que acontece no final?" Efetivamente, no final, todo mundo se punha de pé.

Em muitas ocasiões, as atuações eram interrompidas, porque, se gostavam de alguma coisa, simplesmente o expressavam com gritos, com aplausos, como pessoas muito expressivas, e foi isso que nós recebemos.

Felizmente, nos dias em que estivemos lá, a guerra ainda não havia começado, começou quando a excursão terminou; mas antes que a guerra começasse, fomos testemunhas de que, em muitas cidades, as pessoas estavam contra a guerra, as pessoas não queriam a guerra, e o manifestavam de todas as formas possíveis; ou seja, tanto te diziam, como faziam manifestações na rua, e de repente chegávamos a determinadas universidades – estou me lembrando agora de La Jolla, que todos os estudantes estavam nas esquinas, com cartazes que diziam: "Por favor, se você está contra a guerra, toque a buzina" duas ou três vezes.

Recordo também que em Seattle, que nos impressionou muito, em quase todas as casas – não vamos dizer todas – havia cartazes que diziam: "Não à guerra", e isso realmente nos impressionou muito, porque, evidentemente, não estamos de acordo com a guerra.

Eu penso que nenhum homem quer a destruição de si mesmo, nem quer a destruição de seus filhos, nem quer a destruição da história, da história da humanidade; portanto posso dizer que foi uma turnê em que reinou o amor, a compreensão.

Eles têm muito interesse em Cuba, em saber sobre Cuba e, felizmente, nós estávamos ali para dizer-lhes: "Nós somos Cuba, e podem perguntar-nos o que queiram". Fizemos 23 apresentações. Apresentações especiais também, para as crianças. Demos conferências, ministramos aulas magnas, e eles tinham uma grande avidez sobre o que fazíamos, em todos os lugares em que estivemos.

Randy Alonso – Lizt, aqui se evocou o pensamento de Lincoln, de que não se pode enganar a todo o povo durante todo o tempo. Eu creio que você nos fala de demonstrações nas ruas, que nós vimos aqui, como uma expressão também desse sentimento do próprio povo norte-americano, que, apesar do poder da mídia e de todos os recursos ideológicos que foram utilizados para propugnar a "justiça" dessa guerra, como tentaram apresentar, saiu às ruas para protestar contra ela.

Mas esse mesmo pensamento poderia ser aplicado ao caso de Cuba. Como é o conhecimento sobre a realidade cubana dos estudantes com quem vocês estiveram em contacto, do povo norte-americano que você viu, e que sentimentos encontrou neles, em relação a você e a Cuba?

Lizt Alfonso – Realmente, há muito desconhecimento em relação a Cuba. Muitas pessoas ali não sabem nem onde está Cuba, e muitas, muitas vezes o que te dizem é: "Cuba, a Cuba de Castro, Fidel Castro é Cuba". E eu lhes dizia que Cuba somos todos.

Eles sempre tentavam um intercâmbio, uma aproximação muito, muito estreita, para que nós lhes explicássemos todos esses detalhes. Inclusive, numa oportunidade que tivemos de fazer contacto com alunos da escola secundária e do que aqui é pré-universitário, High School lá, as professoras nos diziam: "Nos os preparamos com antecedência, para que soubessem e pudessem perguntar a vocês tudo que quiserem sobre como é Cuba, o que fazem em Cuba", e nos faziam todo tipo de perguntas, algumas realmente muito interessantes, outras menos; mas nós estávamos ali para responder a tudo, porque nós somos Cuba, digo e repito.

Você falou de Lincoln. Nós tivemos a oportunidade de ir ao Memorial de Lincoln, em Washington, numa turnê anterior, e foi muito emocionante, porque percebi que Lincoln é, para os Estados Unidos, o que Martí é para Cuba, e foi realmente muito emocionante e muito inspirador, poder estudar um pouquinho mais de suas palavras sobre como deve ser o caminho que os homens devem seguir no desenvolvimento da humanidade. Como já disse, foi muito emocionante, uma excursão muito boa, em que mais uma vez se estreitaram os laços dos povos, das pessoas, através da arte.

Randy Alonso – Uma expressão também de como a cultura pode enfrentar a barbárie, de como, diante da proliferação das idéias fascistas, as idéias de irmandade, de humanismo, do melhor do ser humano proliferam também no povo norte-americano e permitem esse intercâmbio entre Cuba e os Estados Unidos; um intercâmbio, Lizt, que, enquanto você estava lá, também se deu com as crianças cubanas de La Colmenita, e Cremata, seu diretor, também está sentado conosco aqui no estúdio, junto com alguns dos integrantes da pequena colméia que viajou aos Estados Unidos.

Cremata, eu gostaria de pedir sua visão desse contacto com o público norte-americano, como esse público os recebeu, agora não na experiência de uma companhia profissional como a de Lizt, senão de um grupo de crianças que foram levar a arte dos pequeninos cubanos aos Estados Unidos, e também como vocês encontraram –eu estive lendo algumas notícias que enviavam dos Estados Unidos – uma expressão caricaturesca desse fascismo lá, nos próprios Estados Unidos.

Carlos A. Cremata – Deixe-me contar uma historinha, e esta, como todas as histórias infantis, tem uma "era uma vez".

Era uma vez... No ano de 1998, aqui em Cuba, no Teatro Nacional, fizemos uma apresentação de "La Cucarachita Martina"; essa que fizemos naquela época com as crianças da escola Solidariedade com Panamá. Assistiu a essa apresentação uma delegação norte-americana muito grande, de personalidades da ciência e da cultura, estava Mohamed Ali, Edward Ashner, e muitos cientistas importantes.

Ali começou essa idéia, ou seja, de repente Mohamed Ali disse, muito emocionado, depois de ter visto aquilo, que, "talvez, se esse espetáculo fosse apresentado nos Estados Unidos, poderia falar mais da cultura, da educação e da saúde em Cuba, que mil discursos", isso ele disse. Começou a rodar a bola de neve, e incorporou-se Patch Adams, "o médico do riso", incorporou-se Belafonte, o mítico grupo Bread and puppet theater... muitas pessoas e muitas organizações, e no fim uma fundação muito bonita, que trouxe mais de 15.000 personalidades norte-americanas a Cuba, chamada Global Exchange, conseguiu o que, depois de muitos anos, parecia impossível: levar, como diziam eles, a primeira delegação artística infantil cubana aos Estados Unidos, em mais de 45 anos, assim dizia o slogan.

Nós pensávamos: Bem, e antes de 45 anos? Não sei, parece-me um pouco mais difícil antes de 45 anos; mas esse era o slogan da delegação.

Chegamos lá, e a primeira coisa que aconteceu, depois de tantas travas tão difíceis, como o famoso problema dos vistos, que todos sofremos, e esse problema foi tão forte, que no próprio dia em que viajávamos foram concedidos os vistos, e tinham dito que todos os vistos estavam autorizados, e de repente, quando chegamos, eles tinham esquecido quatro vistos, entre eles o da pessoa especializada que iria com Mabelita – uma menina conhecida e amada por todo o povo de Cuba, nós a chamamos de abelha-rainha, a menina da escola Solidariedade com Panamá, que tem esse talento assombroso, que agora está estudando na Escola de Instrutores de Arte –, e Mabelita não pôde ir. Isso lhe causou toda essa tristeza, lógica, de ter-se preparado fortemente para uma turnê, e não poder ir porque a pessoa especializada não vai. Além disso, deixaram de ir quatro companheiros que eram imprescindíveis para a turnê.

Depois, na primeira apresentação, na Universidade Católica de San Diego, uma universidade belíssima, aconteceu uma coisa inusitada para nós: anunciaram pela imprensa, por rádio e televisão, que Alpha-66 tinha preparado uma manifestação contrária, uma coisa realmente aberrante, eram criancinhas – você podem ver – ali dentro cantando.

Randy Alonso – O fascismo não entende isso.

Carlos A. Cremata – Claro que não entende.

Veio a polícia, patrulheiros, policiais armados, desses que vemos nos filmes, e no final, o que tinham comentado tanto eram seis pessoas, nada mais, seis pessoas maiores de idade, com uns cartazinhos um pouco ridículos, que diziam duas ou três barbaridades bem loucas. Então se revelou a solidariedade latino-americana, disso também nos haviam falado, há um grupo de companheiros latino-americanos que imediatamente apóiam a Cuba.

Eles nos diziam que, se San Diego foi assim, que era uma população mais pacífica, então, quando estivéssemos em Los Angeles, seria terrível. Na verdade depois não aconteceu absolutamente nada mais. Eu imagino que o ridículo de fazer uma coisa assim quando há crianças tão pequeninas dentro cantando à paz, ao amor. Então não aconteceu mais nada; o que aconteceu, durante toda a turnê, foi o mesmo que aconteceu com Lizt: um carinho extraordinário de um povo maravilhoso. Todas, todas as pessoas que se aproximaram, que se relacionaram conosco..., o contacto humano foi lindíssimo.

Atuamos em grandes teatros, no Conga Room, a famosa casa noturna de Jennifer López e Andy García, em Los Angeles; no Brava Theather, de San Francisco, em grandes teatros, teatros importantes de lá.

Mas também tivemos a oportunidade de ir a escolas, como aconteceu com a Lizt. Estivemos numa escola pública de crianças pobres, sem recursos, a Hoover High School, onde vimos como as crianças são revistadas para entrar nas escolas, ou seja, para que não entrem com armas brancas, etc.; como a escola estava fechada, cheia de cadeados, uma coisa que nossas crianças nem imaginavam.

E no dia seguinte estivemos numa escola de Los Angeles, que se chama Cross Rouge School, uma escola para ricos, que custa 15.000 dólares por ano, aumentando 2.000 dólares a cada ano, e pudemos ver e falar sobre esse contraste, que tínhamos visto na Venezuela, e tínhamos visto no Panamá, mas nos Estados Unidos é onde realmente se vê o supercontraste.

Estivemos numa escola muito linda, que se chama Sementes do Povo, que tem muitas crianças asiáticas, afro-norte-americanas e latinas, que tem princípios similares aos de la Colmenita, e eles nos pediram, depois de ver a apresentação, que lhes organizássemos uma Colmenita ali em Los Angeles... Maravilhoso!

Levamos três espetáculos, em inglês e em espanhol, espetáculos completamente em inglês e espetáculos bilíngües, e entre eles levávamos "Sonho de uma noite de verão", um paradigma da cultura anglo-saxônica visto à maneira cubana, e isso criava uma coisa extraordinária, um silêncio absoluto daquele público que conhecia tantas versões da obra de Shakespeare.

Por todas essas coisas, entregaram-nos as chaves da cidade de San Francisco. Entregaram-nos diplomas ao mérito, muito bonitos, no condado e na cidade de Los Angeles. Convidaram-nos a uma sessão da Câmara, como televisão, ao vivo. De repente, a Câmara parou, e as crianças começaram a cantar "Chivirico", e todo mundo começou a dançar, todos os senadores. Imagino que não seja muito comum essa "bagunça" que levamos à Câmara.

Uma coisa muito importante: o estado da Califórnia editou, há algum tempo, a Resolução nΊ 39, contra o bloqueio, o que dignifica muito o estado da Califórnia; depois editaram uma segunda resolução, pela outorga de cidades irmãs, e editaram uma terceira, a Resolução nΊ 521, que anda por aí, que é a resolução para honrar a La Colmenita, entre outras coisas, por ser a primeira companhia infantil cubana que visita em mais de 45 anos. E, além disso, sobretudo, por lutar pelas artes e pela prevenção da violência infantil. Isso foi realmente extraordinário.

Eu contava que a última apresentação foi dura, porque nós, sim, fomos surpreendidos pela guerra. Ou seja, a penúltima apresentação, 30 minutos antes de começar, nos dizem: Acaba de começar a guerra. Aquela apresentação foi muito forte.

E no dia seguinte, como a população da Califórnia e de San Francisco é tão de esquerda e tão progressista, todas aquelas pessoas saíram às ruas, inutilizaram as ruas, jogavam-se no chão com correntes, amarrados aos postes, etc., e nos explicam que a última, que sempre é a mais linda, não podia acontecer, porque não poderíamos chegar ao teatro, e de repente suspendemos a apresentação. A apresentação seria às sete da noite, e mais ou menos às quatro, nos dizem que o teatro estava fervendo, e que as pessoas saíam da manifestação diretamente para lá, e que não podíamos deixar de fazê-la, que era preciso buscar uma forma de chegar. Imagine o que foi isso!

Obviamente, não nos recusamos, fomos para lá, e foi uma apresentação que não vamos esquecer nunca, porque foi de uma eletricidade especial. Aquele público que nos dizia que estava se manifestando desde a madrugada nas ruas, e que tinha vindo de manifestar-se contra a guerra para cantar à paz, e, além do mais, com crianças cubanas. O teatro estava abarrotado, "não cabia um grão", e as pessoas, como disse a Lizt, começaram a assobiar, como se estivessem num jogo de futebol, era uma coisa estranhíssima.

Randy Alonso – Um impacto, Cremata, que eu imagino que também tem a ver com as mesmas reflexões feitas por um jornalista de San Francisco, de como, enquanto aquela administração fascista proclamava seu direito de atacar qualquer canto obscuro do mundo e começava uma guerra contra o Iraque, em que muitas crianças morreram, enquanto isso, as crianças cubanas que estavam ali em San Francisco deram uma lição incrível de humanismo e de solidariedade, e eu li num dos meios de difusão de San Francisco sobre o gesto das crianças cubanas.

Eu gostaria que você contasse isso também.

Carlos A. Cremata – Sim, eu tinha deixado isso para o final, porque ocorreu-nos de repente. Tivemos de tomar uma decisão, e creio que foi uma decisão muito linda. É que tudo que se arrecadasse na excursão, do ponto de vista comercial, tínhamos estabelecido, já antes de ir, o compromisso – nós mesmos e eles, é claro –, de doá-lo à saúde pediátrica cubana. Isso dos teatros repletos, a arrecadação da bilheteria, etc., doar à saúde pediátrica cubana; mas quando chegamos lá, soubemos que, em função da guerra, haviam cortado selvagemente os fundos de assistência social, a assistência médica às crianças californianas. Então, entre todos, decidimos 50 e 50; ou seja, trazer a metade para a pediatria cubana, e deixar a outra metade, para as crianças californianas pobres, que nós vimos ali, que estão numa situação extraordinariamente crítica. Dissemos isso também aos amigos norte-americanos, e provocava uma reação muito bonita, de como deve ser o futuro, essa coisa de compartilhar culturas, de os povos compartilharem. E tenho certeza de que serão exatamente as crianças que irão fazê-lo. Isso nos cabe, nós merecemos isso, as duas culturas e os dois povos, e as crianças foram como embaixadores disso que certamente vai acontecer.

Randy Alonso – Sem dúvida, é a vitória do melhor do ser humano, do humanismo frente à barbárie e frente à incultura fascista.

Obrigado por seu testemunho, Cremata.

(Passam imagens do tema)

Randy Alonso – Essa convocação dos artistas e escritores cubanos – como nos disse Carlos Martí, no princípio de nossa mesa-redonda, e Roberto Fernández Retamar nos reafirmou, em seu comentário – está inspirado no movimento dos intelectuais norte-americanos que disseram "Não em nosso nome"; está inspirado nos intelectuais que, na Europa e na América Latina, também expressaram seu grito contra essa guerra injustificável, e é que, para esse grande movimento, para essa convocação feita pela intelectualidade cubana a uma frente antifascista internacional, devem desempenhar, e de fato estão desempenhando um importante papel, a partir do próprio movimento social, novas vozes da intelectualidade de esquerda em nosso continente e na Europa, cujo surgimento e impulso foram testemunhados por Fernando Martínez Heredia, ativo participante nos fóruns de Porto Alegre, conhecedor da história dessas novas vozes da esquerda latino-americana e européia.

Fernando, eu gostaria que você fizesse uma avaliação de como esta nova intelectualidade de esquerda enfrentou, com suas, vozes, com seus escritos, esse ressurgimento do fascismo que a Casa Branca pretende impor ao mundo.

Fernando M. Heredia – Randy, é muito bom, falar depois de Cremata, com esse relato tão emocionante da Califórnia. A gente vê como é possível enfrentar o próprio monstro – como escreveu Martí, aquela vez –, as forças que sim são as forças do mal.

Eu falarei um pouquinho dos intelectuais que estão expressando sua oposição ao imperialismo, e dos que estão indo mais longe que expressar essa oposição, analisando os principais problemas do mundo de hoje, buscando caminhos, conscientizando pessoas, tratando de contribuir para criar outro mundo, mais humano que este, através da luta contra o imperialismo.

Está claro que o principal, atualmente, é a resistência. Nos anos noventa, no princípio, pretendeu-se que nunca mais haveria resistência; inclusive, que a história estava terminando.

Hoje, embora o nível de agressão imperialista seja maior que nunca, ninguém se atreveria a dizer isso. Creio que essa é a primeira lição.

Em Seattle, em novembro de 1999, tomou-se consciência de algo que vinha acontecendo nos últimos anos, que era um crescente protesto no Primeiro Mundo, dos que não queriam ser cúmplices; dos que, por exemplo, em Birmingham, na Inglaterra, em maio de 1998, tinham-se oposto, em multidões, exigindo a remissão da dívida dos povos do Terceiro Mundo; ou dos que tinham feito isso antes, em Colônia, na Alemanha; dos que continuaram fazendo, em Gênova. Há também essa campanha de intelectuais, como Ramonet, contra o pensamento único; foram confluindo e, então, apareceu outra vez, mais visível, essa fração de intelectuais do Primeiro Mundo que nunca se renderam ao capitalismo.

Por outro lado, na América Latina, apesar das ditaduras genocidas das últimas décadas, e do conservadorismo de universidades e outras instituições culturais, e da política em geral, existe hoje uma imensa cultura política. Essa imensa cultura política é uma conquista que os povos da América Latina pagaram caro; mas estão começando a aproveitá-la. A produção de pensamento e de ciências sociais latino-americanas, crítica ou oposta à dominação, é sumamente importante e é cada vez maior.

Há outro fenômeno que me parece muito importante: a expansão do número dos que têm atividade intelectual.

Hoje a pessoa encontra, por toda parte, dirigentes e ativistas sociais e políticos que têm muitíssimo mais capacidade que os que conhecíamos quando éramos muito jovens, e que, além de tudo, tratam de recuperar a memória histórica das lutas e das idéias, memória que o capitalismo está tentando apagar e induzir a maioria dos povos a esquecer.

Há um grande número de fatos que também marcam a rebeldia – estou pensando em Chiapas ou na Argentina de dezembro de 2001 –, que nos recordam sempre que hoje a rebeldia e a maturidade da cultura.

Vou referir-me um pouco aos fóruns sociais mundiais. São três os que se celebraram em Porto Alegre, Brasil, no mês de janeiro de cada ano: 2001, 2002, 2003. Neles houve uma confluência de correntes, de pensamentos e de protestos de diferentes regiões do mundo, e foram crescendo, até que, neste último, participaram mais de 100.000 pessoas; uma nova força de oposição ao sistema imperialista, é como uma imensa colméia.

Foi até um exagero, houve 1.700 oficinas, por exemplo, dúzias e dúzias de conferências, naqueles teatros que, na verdade, são ginásios, são estádios, onde pode haver 10.000, 12.000, até 15.000 brasileiros, e gente de todas as partes do mundo que tratou de chegar até lá. É uma nova força social, aglutinadora de diversidades, que oferece espaço e autoconfiança aos que protestam contra ou rechaçam, com maior ou menor consciência, o sistema, sem os inconvenientes que têm hoje os setores políticos de esquerda, da política prática, porque estes estão em situação muito desvantajosa.

O movimento é muito atraente, muito aceitável para muitos. Tem, sem dúvida, uma função de canalizar organizações, algumas mais velhas, outras surgiram nos últimos anos, e tem o inconveniente, pode-se dizer, também de ser muito heterogêneo, de não ser um veículo para um grau de organização muito maior que o dos próprios fóruns, nem para fazer propostas mais organizadas que essas. Mas, em minha opinião, podem ser e são uma escola anticapitalista e um viveiro também para organizações políticas, que vão ter de vir.

Gostaria de chamar a atenção para um importante aspecto: há não apenas a presença e atividades de muitas personalidades e de várias organizações que são decididamente antiimperialistas, que inclinam a balança a favor dessa atitude frente a outros mais moderados, senão que há também uma multidão de jovens ansiosos por saber e serem opositores ao sistema.

No segundo fórum, a que compareceu uma delegação cubana ainda pequenininha – estavam dirigentes sindicais como Pedro Ross e outros companheiros –, era emocionante ver a quantidade de jovens latino-americanos que apareciam onde quer que houvesse, ou se pensasse que haveria, algo sobre Cuba; inclusive, uma vez, foram por engano a uma oficina de educação popular, e todos ali lhes explicavam: "Não, não, mas..." Eles diziam: "Está bem, mas falem de Cuba de qualquer maneira; falem, digam algo, porque vocês devem saber alguma coisa de Cuba".

Isso nos dá uma idéia do papel que tem a mobilização, e pudemos vê-lo frente à ameaça de guerra e à própria guerra contra o Iraque, em 15 de fevereiro, em 15 de março, agora no dia 12, com mobilizações gigantescas e simultâneas em inúmeros países.

Gostaria de pelo menos mencionar algumas pessoas, cientistas sociais muito notáveis da América Latina e de outros lugares: Emir Sader, Michael Lowy, Atilio Borón, gente como Eduardo Galeano, que comoveu a cinco mil brasileiros, na noite em que se inaugurava o primeiro jornal de esquerda a partir de um movimento camponês – o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra –, e ali cinco mil pessoas vibravam com Eduardo Galeano, ou com o maravilhoso Sebastião Salgado, um dos maiores fotógrafos do mundo, que falava de fotos e também falava de resistência camponesa.

João Pedro Stedile, dirigente desse movimento, deu uma verdadeira aula magna sobre a história do capitalismo – num estádio gigantesco –, do colonialismo, da luta pela reforma agrária e do que esta significa hoje.

Bem, Fernando Solanas, Pino deu uma conferência maravilhosa. Aliás – como dizia há pouco Julio García Espinosa –, Pino disse ali: "Há dezenas de nações e povos que ainda não produzem suas próprias imagens, e, em seu lugar, vêem imagens, memórias estéticas, línguas e gestos que lhes são alheios".

Frederick Jameson, o grande pensador norte-americano, falou sobre identidade cultural e representações simbólicas, Lowy, sobre guerra cultural, memória de resistência, etc.

Não quero estender-me muito, porque não há tempo, mas temas como o de lançar um esquema de comércio mundial alternativo, que se contraponha à Organização Mundial de Comércio, ou um projeto de democratização dos grandes meios de comunicação, ou propostas de solução pacífica e justa de conflitos bélicos existentes, democratização de organizações internacionais, começando pela ONU, foram questões tratadas pelo fórum, o que dá uma idéia da profundidade política desse tipo de atividade.

O pensamento social latino-americano comprometido com a libertação já é forte, e está crescendo. Por seu lado, o imperialismo perdeu suas bandeiras de progresso e abandonou suas promessas, e esse descrédito é cada vez maior porque não se trata só de criminalidade e prepotência; é a própria natureza do imperialismo atual que o faz arremeter contra a soberania dos povos e contra suas próprias formas democráticas de dominação. Ele já não tem lugar para uma grande parte de seus trabalhadores, que explorou, nem para uma grande parte da população do planeta, nem para a conservação do meio.

Cuba é o exemplo palpável de que uma sociedade pode viver de outra maneira, de uma maneira humana e solidária, e é uma grande esperança para aqueles intelectuais que estão comprometidos com seus povos. É necessário que estreitemos laços de intercâmbio e de conhecimento, e de discussão de nossas idéias e de solidariedade frente ao inimigo comum.

Creio que os intelectuais cubanos estamos em condições privilegiadas para levar adiante a tarefa que nos pedia ontem a doutora Pogolotti, no Conselho Nacional Ampliado da UNEAC, de desenvolver o pensamento social e as idéias que hoje se necessitam tanto e com urgência, para aprofundar a resistência e para tomar a ofensiva na guerra cultural contra o fascismo, contra o imperialismo e contra o capitalismo.

Randy Alonso – É a expressão do pensamento do melhor da intelectualidade latino-americana e mundial, que busca alternativas para o capitalismo feroz implantado no mundo, e que também enfrenta as diretrizes ideológicas desse fascismo universal que se pretende impor.

A cultura, a arte é a melhor arma para enfrentar a barbárie.

Hoje, quando os artistas e escritores cubanos levantam suas vozes contra o neofascismo ditatorial, nossa mesa-redonda faz um chamado aos melhores sentimentos do ser humano, desde a voz de Silvio Rodríguez, que nos deu a honra de estrear o vídeo de seu já inadiável Encontro com anjos.

DESDE OS TEMPOS MAIS REMOTOS

VOAM OS ANJOS GUARDIÃES

SEMPRE ZELOSOS DE SEUS VOTOS

CONTRA ATROPELOS E DESMANDOS

JUNTO AOS BERÇOS INFANTIS

JUNTO AOS TRISTES MORIBUNDOS

CONTAM QUE ESTÃO OS GENTIS

SERES COM ASAS DE OUTRO MUNDO

QUANDO ESSE ANJO CRUZA O CÉU

NÃO HÁ NADA QUE SE ASSEMELHE

O FINAL DE SEU VÔO APRESSADO

É A SENTENÇA DE UM HEREGE

NÃO SE DISTRAIA NEM DEMORE

TUDO AGORA É INOPORTUNO

VÁ RUMO AO CAMPO DAS FLORES

ONDE A FOGUEIRA ESPERA POR BRUNO

UM ANJO SE LANÇA DAS ALTURAS

QUEDA LIVRE QUE ARREPIA

A ORDEM DA CHEFIA

É DESCER ATÉ DOIS RIOS

É 19 E TAMBÉM MAIO

MONTE DE ESPUMA E SERRA MÃE

QUANDO OUTRO ANJO A CAVALO

CAI "COM OS POBRES DA TERRA"

DIZEM QUE À BEIRA DA LAGOA

UM ANJINHO COMPASSIVO

PASSOU DIANTE DA LUA

SOBREVOANDO AS OLIVEIRAS

E CONTAM QUE COM MALDOSA ARTIMANHA

FOI TIROTEADO SEU ABANICO

JUSTO NA HORA EM QUE NA ESPANHA

SE ASSASSINAVA A FEDERICO

UM BELO ARCANJO VOLTEIA

JUNTO A UM GRANDE PÁSSARO DE FERRO

BUSCA QUE UM HOMEM O VEJA

PARA AFASTAR CEM MIL DESTERROS

MAS O ARCANJO SE SUFOCA

E UMA ASA AZUL SE MACHUCA

E A AVE NEGRA ABRE LA BOCA

QUANDO ATRAVESSAM HIROSHIMA

SOBRE MENPHIS – TENNESSEE

PASSOU VOANDO APRESSADO

UM SER ALADO EM FRENESI

IA VESTIDO DE LUTO

IA CHORANDO O QUERUBIM

ELE IA CONTANDO OS MINUTOS

DE DEUS E MARTIN LUTHER KING

O ANJO PASSA UMA PONTE

DEPOIS RODEIA UM ARRANHA-CÉU

PARQUE CENTRAL CHEIO DE GENTE

NÃO PERCEBE SEU VÔO

QUANTA UTOPIA SE ROMPERÁ

E QUANTO DE IMAGINAÇÃO

QUANDO À PORTA DO DAKOTA

AS BALAS DERRUBEM A JOHN

SETEMBRO UIVA AINDA

SEU DUPLO SALDO ARREPIANTE

TUDO SUCEDE NUM DIA

GRAÇAS A UM ÓDIO SEMELHANTE

O MESMO ANJO QUE LÁ NO CHILE

VIU BOMBARDEAR O PRESIDENTE

VÊ AS TORRES GÊMEAS COM TANTA GENTE

CAINDO INESQUECIVELMENTE

DESESPERADOS OS QUERUBINS

TOMAM OS CÉUS DA TERRA

E COM SEUS LÁPIS DE NUVENS

PINTAM DEUSES DA GUERRA

O MUNDO ENCHE AS VARANDAS

E EXCLAMA AO FINAL: ESTA É MINHA LUTA

MAS O SENHOR DOS CANHÕES

NÃO OLHA O CÉU NEM O ESCUTA

POBRES DOS ANJOS URGENTES

QUE NUNCA CHEGAM A NOS SALVAR

SERÁ QUE SÃO INCOMPETENTES?

OU QUE NÃO HÁ COMO AJUDAR-NOS

PARA EVITAR MAIS DORES

E CONTAS DE PSICANALISTA

SEJAMOS UM POUQUINHO MELHORES

E MUITO MENOS EGOÍSTAS

SEJAMOS UM POUQUINHO MELHORES

E MUITO MENOS EGOÍSTAS

Randy Alonso – Encontro com anjos, um chamado ao melhor do homem, em que Silvio Rodríguez reuniu as vontades de Frank Fernández, Leo Brower, Chucho Valdés, José María Vitier, Juan Formell, Tatagüines, Niurka González, Noel Nicola, Vicente Feliú e Amaury Pérez, que, aliás, hoje nos acompanham também em nosso estúdio.

Os anjos urgentes que nunca chegam para nos salvar, como diz Silvio. E para que esses anjos urgentes possam sim salvar o mundo, a intelectualidade cubana fez uma convocação a todos os artistas e escritores do mundo, a criar uma frente antifascista mundial, em que muitas coisas faltam por fazer de agora em diante, e das quais eu gostaria que Carlos Martí informasse nosso povo, neste final da mesa-redonda.

Carlos Martí – A intervenção de Fernando me dá muitas idéias, porque, de fato, o fórum de Porto Alegre foi uma experiência importantíssima, forte, para saber que temos uma oportunidade excepcional para criar uma frente antifascista. Há uma consciência, os intelectuais recuperaram o papel que lhes corresponde na sociedade e estão trabalhando firmemente, como diz o documento da UNEAC, por tornar realidade uma conduta cívica, de compromisso, para atingir objetivos que sirvam à luta contra as idéias e práticas neofascistas.

Penso que em Cuba, além disso, temos o privilégio de estarmos unidos na vanguarda de intelectuais e artistas, temos uma organização que é forte nesse sentido, e que realmente podemos convocar não apenas a nossa organização, senão a outras organizações que tenham a ver com o trabalho intelectual.

Já estamos recebendo adesões da União de Jornalistas de Cuba, adesões da Associação de Pedagogos de Cuba. Transmitimos essa mensagem a outras sociedades científicas. Parece-me que é preciso mobilizar todo o talento, tudo que possa contribuir, para lançar essa frente. É uma frente em que vamos convocar o mundo a que se some contra o fascismo.

Há muitas coisas por fazer.

Eu tenho notícias novas nestes cabos. Esta vem da América Latina e se refere a uma frente internacional de intelectuais contra a guerra. Tenho esta carta, assinada recentemente por um grupo dos mais importantes intelectuais mexicanos, sobre o caso da Comissão de Direitos Humanos, mas que tem a ver também com a luta atual contra o neofascismo, e está assinada pelos principais intelectuais mexicanos. Ou seja, estamos em condições excepcionais.

No Conselho Nacional pudemos trocar idéias para estabelecer essa frente e um programa de trabalho, e vamos nos empenhar em tarefas muito concretas. Quero mencionar algumas.

Trabalhamos na desmontagem dessa doutrina neofascista. Vamos lançar nossas idéias ao mundo e conectar-nos com todos que possam fazer parte dessa frente.

A convocação já foi traduzida a sete idiomas e distribuída a parlamentos, universidades, organizações de intelectuais, sítios Web, e continuaremos distribuindo.

De fato já temos alguma repercussão. Por exemplo, El Mundo, da Espanha, está citando praticamente todo o documento.

Randy Alonso – O diário El País, da Espanha, também o publica.

Carlos Martí – E no diário El País, da Espanha, também, embora misturado com outras coisas.

Randy Alonso – Alguns diários latino-americanos também fizeram eco desse chamamento.

Carlos Martí – Isso realmente nos enche de ânimo, porque sabemos que podemos seguir avançando em nossa tarefa de abrir caminho à verdade.

Randy Alonso – Você falava de um site web também.

Carlos Martí – Teremos um sítio Web nos próximos dias, com a colaboração do Ministério de Cultura. É um sítio Web intelectuais e artistas contra o fascismo, para que possamos ter aí correios, possamos ter informações, atualizar-nos permanentemente, e convocar a todo que queira participar dessa frente.

Temos realmente de convocar a todos os colegas do mundo e às pessoas de boa vontade. Vamos fazê-lo com firmeza, vamos fazê-lo trabalhando cotidianamente para contra-arrestar essa manipulação midiática.

A batalha midiática contra o neofascismo é tão importante porque vemos, no caso da guerra contra o povo iraquiano, como eles aproveitaram para apagar a síndrome de Vietnã da memória do povo norte-americano. Ou seja, está em marcha um plano verdadeiramente fascista de propaganda e desinformação.

Vamos nos empenhar a fundo. Há muitas idéias. Organizam-se novas publicações; convocamo-nos a participar em fóruns, intercambiar documentação com frentes parecidas que estão aparecendo em diferentes lugares do mundo. As universidades são centros fundamentais para abrir esse tipo de reflexão; os centros de ciência também, é claro.

Estou plenamente seguro de que essas e outras medidas terão um efeito imediato. É preciso trabalhar rápido, temos os meios necessários, temos o talento em nosso país, para convocar uma frente antifascista mundial. É urgente fazê-lo, pois os acontecimentos se precipitam, e não há tempo; vamos, portanto, trabalhar cotidianamente para criar consciência e abrir caminho à verdade.

Esse é nosso dever cotidiano, para que a barbárie não consiga impor-se, e se possa salvar a civilização humana e a luz de sua mais transcendente espiritualidade.

Randy Alonso – Uma batalha em que também se luta pela verdade de Cuba, porque a verdade de Cuba abre caminho em meio a tanta mentira da mídia, e para que a intelectualidade cubana esclareça, com suas posições, a posição de Cuba diante do mundo e sirva também como instrumento de batalha e de defesa das melhores idéias da cultura humana, frente às idéias fascistas que pretendem impor ao mundo.

Dessa maneira, estamos chegando ao final de nossa mesa-redonda desta tarde. Quero agradecer aos prestigiosos intelectuais e artistas que me acompanharam no painel ou do estúdio, aos convidados que tivemos conosco, especialmente ao companheiro Abel Prieto, ministro de Cultura.

Estimados telespectadores e ouvintes:

Ancorada nas doutrinas da extrema-direita, que proclama abertamente o papel dos Estados Unidos como império destinado a modelar os destinos do mundo, inspirada no mais tenebroso pensamento de Hitler e sua camarilha fascista, impulsionada por um messianismo que revive o "destino manifesto", a atual administração norte-americana pretende implantar uma tirania fascista mundial.

Um governo que chegou ao poder sob o manto da fraude, que se serviu dos execráveis sucessos de 11 de setembro de 2001, para tentar legitimar-se e implantar sua preconcebida política de saqueio e dominação universal, baseada num devastador poder tecnológico, militar, pseudocultural e midiático.

A invasão militar do Iraque e as atuais ameaças à Síria e outras nações são expressão brutal da doutrina do ataque preventivo, proclamada ontem por Hitler e retomada hoje por Bush.

Frente aos propósitos neofascistas do atual governo norte-americano, os escritores e artistas cubanos, inspirados no movimento intelectual que, nos Estados Unidos, Europa, América Latina e em outras partes do mundo proclamou: Não em nosso nome, e nos milhões de homens e mulheres que gritavam nas ruas: "Não à guerra", levantou sua denúncia dos extremos perigos que hoje corre a humanidade, e chamou a criar uma grande frente internacional antifascista, da consciência e das idéias.

Diante da barbárie universal que se pretende implantar, recordo ao Fidel que nos alertou que "Sem cultura, não há liberdade possível".

Muito boa noite.