A primeira
impressão, se não se recebe informação adicional, é que se tratava de um boato
nascido da antipatia que toda força de ocupação provoca.
Como se poderia provar isso? Muitos de
nós não conhecíamos as características da cólera e suas vias de transmissão.
Poucos dias depois pararam os protestos no Haiti e não se falou mais do
assunto.
A epidemia seguiu o seu curso inexorável, e
outros problemas, tais como os riscos derivados das eleições, ocuparam o nosso
tempo.
Hoje chegaram as
notícias fidedignas e críveis do que realmente havia acontecido. O povo
haitiano tinha razões de sobra para expressar seu protesto indignado.
A agência de notícias AFP informou textualmente que: "O
destacado epidemiologista francês Renaud Piarroux conduziu uma investigação no
mês passado no Haiti e chegou à conclusão de que a epidemia foi causada por uma
cepa importada, e se estendeu desde a base nepalesa"da Minustah.
Outra agência europeia, a EFE, informou que: "A origem da doença se encontra no pequeno
povoado de Mirebalais, no centro do país, onde os soldados nepaleses
estabeleceram seu acampamento, e apareceu alguns dias depois da sua chegada,
comprovando-se a origem da epidemia ... "
"Até agora,
a missão da ONU no Haiti (Minustah) tem negado que a epidemia entrara através
de seus capacetes azuis".
" (...) o
dr. francês Renaud Piarroux, considerado um dos principais especialistas do
mundo no estudo da epidemia da cólera, não deixa dúvidas da origem da
doença..."
"O estudo
foi encarregado por París a pedido das autoridades haitianas, indicou um
porta-voz da diplomacia francesa".
"(...) a
aparição da doença coincide com a chegada dos soldados nepaleses que, além
disso, veem de um país onde há uma epidemia da cólera".
"De outra forma não se explica o
surgimento tão repentino e forte da doença em um pequeno povoado de poucas
dezenas de habitantes".
"O relatório também analisa a forma
de propagação do mal, já que as águas fecais do acampamento nepalês eram
drenadas no mesmo rio em que os habitantes do povoado bebiam água".
O mais
surpreendente que fez a ONU foi, segundo comunicou a agência, o "... envio
de uma missão de investigação ao acampamento nepalês, que concluiu que essa não
poderia ser a origem da epidemia”.
O Haiti, em meio
à destruição do terremoto, à epidemia e sua pobreza, não pode prescindir
agora de uma força internacional que coopere com uma nação arruinada pelas
intervenções estrangeiras e pela exploração das empresas transnacionais. A ONU
não só deve cumprir o seu dever elementar de lutar pela reconstrução e o
desenvolvimento do Haiti, mas também deve mobilizar os recursos necessários
para erradicar uma epidemia que ameaça com se espalhar para a vizinha República
Dominicana, o Caribe, América Latina e outros países similares da Ásia e
África.
Por que a ONU
insistiu em negar que a Minustah trouxe a epidemia ao povo do Haiti? Não
culpamos o Nepal, que no passado foi colônia britânica, cujos homens foram
usados nas suas guerras coloniais, e hoje buscam empregos como soldados.
Indagamos dos médicos cubanos que hoje
oferecem seus serviços no Haiti e nos confirmaram a notícia transmitida pelas
mencionadas agências de notícias europeias com notável precisão.
Faço um breve resumo do que nos disse Yamila
Zayas Nápoles, especialista em medicina geral integral e em anestesiologia,
diretora de uma instituição médica de oito especialidades básicas e dos meios
de diagnósticos do projeto Cuba-Venezuela, inaugurado em outubro de 2009 na
área urbana de Mirebalais, com 86 000 habitantes, no departamento norte.
No
sábado, 15 de outubro, foram internados três pacientes com sintomas de diarréia
e severa desidratação; no domingo, dia 16, foram internados quatro com
características semelhantes, mas eram da mesma família, e tomou-se a decisão de
isolá-los e comunicar o incidente à missão; na segunda-feira, dia 17,
repentinamente, foram internados 28 pacientes com sintomas similares.
A
Missão Médica urgentemente enviou um grupo de especialistas em epidemiologia,
que colheram amostras de sangue, vômitos, fezes e dados, que foram enviados com
urgência para laboratórios nacionais do Haiti.
Em
22 de outubro, estes relataram que a cepa isolada correspondia à prevalecente
na Ásia e na Oceania, que é mais grave. A base nepalesa dos capacetes azuis das
Nações Unidas está localizada nas margens do Rio Artibonite, que atravessa a
pequena cidade de Meye, onde surgiu a epidemia, e Mirebalais, onde depois
espalhou-se rapidamente.
Apesar da forma repentina com que a cólera
apareceu no pequeno, mas excelente hospital a serviço do Haiti, dos primeiros
2.822 pacientes tratados inicialmente em áreas isoladas do mesmo, apenas 13
pessoas morreram, para uma taxa de letalidade de 0,5%; posteriormente, ao ser
criado, à parte, o Centro de Tratamento da Cólera, de 3.459 doentes, faleceram
5 casos de pacientes muito graves, para 0,1%.
O
número total de doentes da cólera no Haiti atingiu nesta terça-feira, 7 de
dezembro, 93.222 pessoas, e a taxa de pacientes que morreram atingiu a cifra de
2.120. Entre os atendidos pela missão cubana, atingiu 0,83%. O índice de mortos
nas demais unidades hospitalares é de 3,2%. Com a experiência adquirida, as
medidas adequadas e o reforço da brigada "Henry Reeve", a Missão
Médica Cubana, com o apoio das autoridades haitianas, se propôs dar assistência
a qualquer das 207 pequenas comunidades isoladas, de modo que nenhum cidadão
haitiano fique sem assistência frente à epidemia, e muitos milhares de vidas
possam ser preservadas.
Fidel Castro Ruz
7 de dezembro de 2010
18h34