Reflexões
do companheiro Fidel
O MELHOR E MAIS INTELIGENTE
Ontem, por razões de espaço e tempo, não disse uma
palavra do discurso pronunciado por Barack Obama na segunda-feira
Lembrava o que me contou Carter quando nos visitou em 2002 sobre o
cultivo de florestas nos Estados Unidos, visto que ele possui uma plantação
familiar no Estado de Georgia. Nesta visita lhe perguntei de novo sobre aquela cultura
e voltou a expressar que semeia as plantas de pinheiro a uma distância de 3 por
Há muitos anos li que The New York Times, numa edição dominical, consumia o papel
extraído da desflorestação de
É claro que Obama é um excelente articulador de palavras
e frases. Poderia se ganhar a vida escrevendo historietas para crianças. Conheço
seu estilo porque o primeiro que li e sublinhei, muito antes de que assumisse a
presidência, foi um livro titulado os “Sonhos do meu Pai”. Fi-lo com respeito
e, pelo menos, consegui apreciar que seu autor sabia escolher a palavra precisa
e a frase adequada para ganhar a simpatia dos leitores.
Confesso que não gostei da sua tática de suspense,
ocultando suas próprias idéias políticas até o final. Fiz um esforço especial
por não esquadrinhar no último capítulo o que opinava sobre diversos problemas,
do meu ponto de vista fulcrais neste momento da história humana. Tinha a
certeza de que a profunda crise econômica, a colossal despesa militar, e o
sangue jovem derramado por seu predecessor republicano, ajudá-lo-iam a derrotar
o seu adversário eleitoral, apesar dos enormes preconceitos raciais da sociedade
norte-americana. Era ciente dos riscos que corria de que o eliminassem fisicamente.
Por óbvias razões de politicagem tradicional procurou,
antes das eleições, o apoio dos votos dos anti-cubanos de Miami, na sua maioria
dirigidos por pessoal de origem batistiana e reacionária, que converteram os Estados
Unidos numa república bananeira, onde a fraude eleitoral determinou nada menos
que a vitória de W. Bush em 2000, lançando à lixeira a um futuro Prêmio Nobel:
Al Gore, Vice-presidente de Clinton e aspirante à presidência.
Um elementar sentido de justiça teria levado o
Presidente Obama a retificar as conseqüências do infame julgamento que conduziu
ao desumano, cruel, e especialmente injusto encarceramento dos cinco patriotas
cubanos.
Sua Mensagem à União, seus discursos no Brasil, Chile e
em El Salvador, e a guerra da NATO na Líbia, obrigaram-me a sublinhar, mais do
que sua própria autobiografia, o mencionado discurso.
O quê é o pior desse pronunciamento e como explicar as
aproximadamente 2 500 palavras que contém a versão oficial?
Do ponto de vista interno, sua falta total de realismo
coloca seu feliz autor nas mãos dos seus piores adversários, que desejam humilhá-lo
e vingar-se da sua vitória eleitoral em novembro de 2008. Não lhes basta ainda com
o castigo a que o submeteram nos finais de 2010.
Do ponto de vista externo, o mundo tomou mais consciência
do que significam para muitos povos o Conselho de Segurança, a NATO e o
imperialismo ianque.
Para ser tão breve quanto prometi, explico-lhes que Obama
começou seu discurso afirmando que desempenhava seu papel “detendo a força do
Talibã no Afeganistão e perseguindo Al-Qaeda por todo o planeta”.
De imediato acrescenta que: “Durante gerações, os
Estados Unidos da América têm desempenhado um papel singular como alicerce da segurança
mundial e como defensor da liberdade humana”.
Isto é algo do qual, como os leitores sabem, os
cubanos, os latino-americanos, os vietnamitas e outros muitos, podemos dar constância
da sua veracidade.
Após essa solene declaração de fé, Obama investe uma
boa parte do tempo
Mais adiante acrescenta: “…a NATO, tem tomado o comando
para impor o embargo de armas e a zona de exclusão aérea.”
Confirma os objetivos da decisão
“Como resultado da transferência para uma coligação mais ampla, centrada na NATO,
o risco e o custo desta operação –para nosso exército e para o contribuinte
estadunidense-- reduzir-se-á significativamente.
“Por conseguinte, para aqueles que duvidaram
de nossa capacidade para levar a cabo esta operação, quero deixar algo claro: os
Estados Unidos fizeram aquilo que eu disse que faríamos.”
Volta às suas obsessões sobre
Khaddhafi e às contradições que agitam sua mente: “Khaddhafi não tem abandonado
o poder e, enquanto o não fizer, a Líbia continuará sendo um perigo.”
“Verdade é que os Estados Unidos não
podem empregar nosso exército lá onde houver repressão e, levando em conta os
riscos e custos de uma intervenção, sempre devemos fazer um balanço entre os
nossos interesses e a necessidade de agir.”
As obsessões se reiteram uma e outra
vez: “Se tentássemos derrocar Khaddhafi pela força, nossa coligação se quebraria.
Teríamos […] de enviar tropas estadunidenses ao terreno para cumprir essa
missão ou arriscarmo-nos à possibilidade de matar muitos civis com os ataques
aéreos.”
“…temos esperanças no futuro do
Iraque, mas a mudança de regime ali levou oito anos e custou milhares de vidas
estadunidenses e iraquianas e quase 3 milhões de milhões de dólares.”
Dias depois de iniciados os bombardeamentos
da NATO começou a divulgar-se a notícia de que um caça-bombardeiro norte-americano
tinha sido derribado. Depois se soube, por alguma fonte, que era verdade. Alguns
camponeses ao verem descer um pára-quedas, fizeram o que por tradição fazem na
América Latina: foram ver; e se alguém precisa, auxiliam-no. Ninguém podia
saber como pensavam. Com certeza eram muçulmanos, estavam fazendo com que a
terra produzisse e não podiam ser partidários dos bombardeamentos. Um
helicóptero que apareceu repentinamente para resgatar o piloto disparou contra os
camponeses, feriu gravemente um deles, e de milagre não os matou a todos. Como o
mundo sabe, os árabes, por tradição, são hospitaleiros com seus inimigos, alojam-nos
em suas próprias casas, e se colocam de costas para não ver o caminho que eles
seguem. Inclusive um covarde ou um traidor não significaria nunca o espírito de
uma classe social.
Só a Obama lhe podia passar pela
mente a peregrina teoria que incluiu em seu discurso, como pode apreciar-se no
trecho seguinte:
“Não obstante, haverá ocasiões em que nossa segurança não estará diretamente
ameaçada, mas sim nossos interesses e valores. […] sabemos que aos Estados
Unidos, como a nação mais poderosa do mundo, pedir-lhe-ão ajuda com freqüência.
“Nesses casos, não devemos ter medo
de agir, porém o peso das ações não deve recair apenas sobre os Estados Unidos.
Como o temos feito na Líbia, nossa tarefa é então mobilizar a comunidade
internacional para empreender uma ação coletiva.”
“Este é o tipo de liderança que temos
mostrado na Líbia. É claro que, inclusive quando atuemos como parte de uma
coligação, os riscos de qualquer ação militar serão elevados. Esses riscos foram
constatados quando um dos nossos aviões sofreu uma avaria enquanto sobrevoava Líbia.
Inclusive quando um dos nossos aviadores se lançou de pára-quedas, em um país
cujo líder tem satanizado com tanta freqüência os Estados Unidos, numa região
que tem uma história tão difícil com nosso país, este estadunidense não
encontrou inimigos. Em vez disso, foi recebido por pessoas que o abraçaram. Um
jovem líbio que veio em sua ajuda expressou: ‘Somos teus amigos. Estamos tão
agradecidos desses homens que estão protegendo os céus.”
“Esta voz é apenas uma entre muitas
numa região onde a nova geração se opõe a que lhe continuem negando seus
direitos e oportunidades.”
“Mesmo assim, esta mudança provocará
que o mundo seja mais complicado durante um tempo. O progresso será desigual e
a mudança chegará de um modo bem divergente a diferentes países. Existem
lugares, como o Egipto, onde esta mudança nos inspirará e infundirá nossas
esperanças.”
Todo o mundo conhece que Mubarak foi
aliado dos Estados Unidos, e quando Obama visitou a Universidade de El Cairo, em
junho de 2009, não podia ignorar as dezenas de milhares de milhões de dólares subtraídos
por aquele no Egipto.
Continuou com o emotivo relato:
“…acolhemos com beneplácito o fato
de que a história esteja
“…nossa fortaleza no exterior se
sustenta na nossa fortaleza nacional. Esta sempre deve ser nossa Estrela Polar,
a capacidade do nosso povo de alcançar seu potencial, adotar decisões
inteligentes com nossos recursos, incrementar a prosperidade que atua como fonte
do nosso poder, e erguer os valores que tanto apreciamos.”
“Olhemos para o futuro com confiança
e esperança, não só no nosso próprio país, mas também em todos aqueles que têm anseios
de liberdade em todo o mundo.”
A espectacular historieta me fez lembrar
do Tea Party, do senador Bob Menéndez
e da ilustre Ileana Ros, a loba feroz que desafiava as leis para manter seqüestrado
o menino cubano Elián González. Ela é hoje nada menos que Chefe do Comitê de
Relações Exteriores da Câmara de Representantes dos Estados Unidos.
Khaddhafi não se cansa de repetir
que Al-Qaeda lhe faz a guerra e envia combatentes contra o governo da Líbia,
porque ele apoiou a guerra antiterrorista de Bush.
Aquela organização teve no passado
excelentes relações com os serviços de inteligência norte-americanos na luta
contra os soviéticos no Afeganistão, e possui sobrada experiência sobre os
métodos de trabalho da CIA.
O quê acontecerá se as denúncias de
Khaddhafi fossem certas? Como explicaria Obama ao povo norte-americano que uma
parte dessas armas de combate terrestre caísse nas mãos dos homens de Bin
Laden?
Não teria sido melhor e mais
inteligente ter lutado para promover a paz e não a guerra na Líbia?
Fidel Castro Ruz
31 de março de 2011
19h58